A propagação do Covid19 vive uma fase de estagnação, mas a possibilidade da reversão existe, caso sejam descurados os deveres de recolhimento e de proteção. É necessário continuar a apostar na comunicação, adaptada aos diferentes públicos e aos actuais desafios. Isso implica, entre outras coisas, um acompanhamento contínuo da forma como os portugueses recebem e o que fazem com a informação.
Se no início a aposta incidia numa mensagem belicista, com a comparação da atual situação a uma guerra, tendo em vista a mudança de hábitos com base no medo, hoje a mensagem deve ser sobretudo positiva, incluindo informações sobre a eficácia das medidas projectadas para proteger as pessoas da doença, tanto a nível pessoal, como societal. Está-se assim a retirar peso e alarmismo à informação, ajudando os portugueses a caminhar para a fase seguinte desta crise epidémica.
Se queremos mudar comportamentos temos de compreender a força motora dessa mudança, porque uma comunicação informativa não é necessariamente persuasiva. Importa conhecer e gerir continuamente a percepção de risco da população portuguesa, que com o recente levantar das medidas de isolamento social mais extremas pode ter reduzido. É esta percepção de risco que está na base da propagação da doença, influenciando a adopção de comportamentos preventivos de saúde pública.
É importante que a avaliação da percepção de risco público seja precisa, já que percepções de risco subestimadas e exageradas podem potencialmente minar a adoção de comportamentos de saúde protetores, conforme sugerem Leppin e Aro, no seu trabalho publicado em 2009.
Como referiu a minha colega Joana Alves na coluna de opinião da Netfarma*, a falta de adopção de comportamentos de saúde responsáveis pode dever-se a múltiplos fatores. A saber: a) dificuldade de entendimento do conceito de risco e na forma como se traduz na representação objetiva de uma ameaça; b) baixa perceção do risco de contágio; c) avaliação do risco de contágio subvalorizada por influência da memória de epidemias ou pandemias anteriores, com maior sucesso na minimização de contágio e na mortalidade.
Um estudo realizado em Abril 2020, por investigadores da universidade de Cambridge procurou fazer uma avaliação da percepção de risco público do COVID-19 usando amostras nacionais de dez países (Reino Unido, Estados Unidos, Austrália, Alemanha, Espanha, Itália, Suécia, México, Japão e Coréia do Sul). Os dados revelaram que os principais predictores de percepção de risco identificados em mais da metade dos países examinados foram: os valores individualistas e pró-sociais, a experiência pessoal com o vírus (o factor mais importante nos EUA), e a amplificação social por meio de amigos e familiares. Curiosamente, verificou-se igualmente um efeito de género na Alemanha, Espanha e Reino Unido, com os homens a perceberem menos risco do que as mulheres.
Em suma, nesta segunda fase de Covid19, precisamos de uma comunicação persuasiva, que nos dirija com soluções claras e concretas, tendo em vista os valores colectivos que nos unem. “O processo de comunicação é o mais difícil”, confessava a Diretora-geral da Saúde no Programa da Cristina Ferreira em finais de Março, mas é por meio dela que podemos fazer frente a uma epidemia que carece ainda de cura. E também na comunicação a autoridade nacional de saúde pública deve liderar, sem exagerar.
Ana Margarida Barreto
Docente na NOVA FCSH e Investigadora do ICNOVA (Coordenadora do GI EC)
Leppin, A., & Aro, A. R. (2009). Risk perceptions related to SARS and avian influenza: theoretical foundations of current empirical research. International journal of behavioral medicine, 16(1), 7-29.
* https://www.netfarma.pt/comportamentos-em-tempo-de-pandemia/