Os distribuidores farmacêuticos defendem uma atualização anual do preço dos medicamentos como forma de tornar o mercado nacional mais atrativo para a indústria do setor, contribuindo para combater a escassez de fármacos.
“Melhorando a atratividade económica do mercado farmacêutico do nosso país estamos a dar mais condições para que a produção – a indústria farmacêutica – tenha produto disponível no nosso país”, afirmou, ontem, à Lusa o presidente executivo da Associação de Distribuidores Farmacêuticos (ADIFA), Nuno Flora.
Segundo o responsável, desde 2008 “houve uma degradação do preço do medicamento, que foi sempre a descer”, com exceção de 2023 e 2024, anos em que foi feita uma revisão de preços, mas apenas para os fármacos mais baratos, deixando de fora milhares de medicamentos.
Para este ano, a portaria de revisão anual dos preços, publicada em Diário da República em fevereiro, determinou que os medicamentos com preço de venda ao público até aos 10 euros podiam aumentar 3,5%.
O setor atingiu o seu `pico´ em 2008, com quase 3.000 milhões de euros, um valor que não foi alcançado desde então, alertou o presidente executivo da associação que representa distribuidores com 94% de quota de mercado.
“Este é o único mercado que eu conheço que tem menos valor hoje do que tinha em 2008. Ao fim de 15 anos, ele não recuperou valor e foi sempre a perder”, salientou Nuno Flora, para quem a legislação atualmente em vigor “só leva à redução de preço” dos medicamentos.
Perante isso, defendeu a necessidade de obter um compromisso com vista a uma atualização automática dos preços anualmente que permitisse uma correção face ao custo real da produção, da distribuição e da dispensa.
“É fundamental um compromisso de atualização de preços e o melhor compromisso que encontramos, para garantir a competitividade e atratividade do nosso mercado, é estar indexada a um indicador como a inflação ou o índice de preços ao consumidor todos os anos”, alegou o representante da distribuição.
O presidente executivo da ADIFA realçou ainda que o “problema efetivo de escassez” de medicamentos não se verifica apenas em Portugal, uma vez que se trata de um bem com produção limitada e com procura global.
Apesar de ser um problema de âmbito mundial, Portugal apresenta dois constrangimentos – a pequena dimensão do seu mercado e o reduzido preço dos medicamentos -, referiu Nuno Flora, ao salientar que, nos últimos anos, fatores como o aumento das remunerações e do custo da eletricidade e dos combustíveis “encareceram muito a distribuição de medicamentos”.
Perante essa situação, o presidente executivo da associação garantiu que não está em causa a qualidade da distribuição nacional de medicamentos, mas pode estar a “sustentabilidade das empresas” e mesmo a sua sobrevivência a médio prazo.
Nuno Flora considerou também que o aumento do preço dos medicamentos no mercado português poderia refletir-se no preço de venda, mas não diretamente no que os utentes pagam, se o Estado aumentar as comparticipações.
Estes distribuidores são responsáveis pelo processamento de toda a cadeia de fornecimento dos medicamentos: encomenda e aquisição junto dos laboratórios, receção, gestão e armazenamento, pagamento aos laboratórios e entrega e faturação às farmácias.
Dispensa de medicamentos em proximidade
“Neste momento, temos cerca de 25 mil doentes que, em diferentes programas a nível nacional, vão às farmácias buscar a sua medicação do hospital, mas há um potencial de cerca de 200 mil pessoas que ainda continuam a ir ao hospital só para ir buscar a sua medicação”, adiantou ainda, à Lusa, o presidente executivo.
Em causa está o regime criado pelo anterior Governo de dispensa de medicamentos em proximidade, cujo diploma foi promulgado pelo Presidente da República no final de 2023, e que prevê que os utentes possam escolher o local onde pretendem levantar a sua medicação, que pode ser numa farmácia ou num hospital mais próximo da residência.
Criado para evitar deslocações ao hospital apenas com o propósito de obter a medicação, na maioria dos casos para doenças crónica, os encargos da dispensa de medicamentos em proximidade são da responsabilidade das unidades que seguem os doentes, não havendo qualquer pagamento por parte dos utentes.
De acordo com Nuno Flora, “temos aqui um potencial muito grande para implementar um serviço, em conjunto com os hospitais e farmácias, que permita trazer serviços em proximidade à comunidade”, salientou o presidente executivo desta associação que representa os distribuidores de medicamentos responsáveis por 94% da quota de mercado no país.
Para o presidente executivo, é necessário “cada vez mais investir em serviços de proximidade”, o que permitiria “descongestionar o próprio Serviço Nacional de Saúde”, contribuindo para que os hospitais fiquem reservados à prestação de cuidados diferenciados.
Como exemplo desta política de proximidade apontou o caso da última campanha de vacinação contra a gripe e a covid-19, que decorreu nos centros de saúde e nas farmácias de todo o país.
“É um excelente exemplo de como, aproveitando a capacidade instalada na comunidade, nos serviços de saúde que estão próximas da comunidade, conseguiu-se aumentar muito o acesso e, neste caso, as coberturas vacinais” da população, salientou o presidente executivo da ADIFA.
Nuno Flora alertou que a dispensa de medicamento em proximidade “ainda não está totalmente implementada” em Portugal, manifestando-se convicto que, a partir de janeiro de 2025, será possível “começar a aproveitar todo o potencial” desta medida.
Segundo referiu, a distribuição farmacêutica já adquiriu experiência nessa matéria, apontando o caso da pandemia de covid-19, altura em que “mais de 200 mil doentes, durante cerca de um ano, receberam a sua medicação na farmácia”, evitando deslocações aos hospitais.
“A distribuição farmacêutica conseguiu fazer essa distribuição em todo o país”, garantiu Nuno Flora, para quem o setor tem a “capacidade instalada para corresponder à plenitude daquilo que o Ministério da Saúde tem como potencial, que é cerca de 200 mil pessoas”.
Já sobre o Plano de Emergência e Transformação da Saúde que está a ser implementado pelo Governo, o presidente executivo da ADIFA considerou que “ficou um pouco aquém” na área específica do medicamento, mas reconheceu que os “maiores problemas da saúde não estão no medicamento, mas sim no acesso e na prestação de cuidados” aos utentes.
A nova equipa do Ministério da Saúde, liderada por Ana Paula Martins, antiga bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, tem demonstrado “abertura e capacidade de diálogo com os agentes do setor”, referiu também o presidente executivo da ADIFA.