Caso das gémeas: Acesso “é da responsabilidade do hospital” 407

A comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas tratadas em 2020 com um medicamento de quatro milhões de euros começou hoje as audições, com o depoimento do ex-secretário de Estado Adjunto e da Saúde António Lacerda Sales. O antigo governante socialista foi, segundo a Lusa, constituído arguido no âmbito deste caso.

Em causa está o tratamento hospitalar de duas crianças gémeas residentes no Brasil que adquiriram nacionalidade portuguesa e receberam no Hospital de Santa Maria (Lisboa) o medicamento Zolgensma. Com um custo de dois milhões de euros por pessoa, este fármaco tem como objetivo controlar a propagação da atrofia muscular espinal, uma doença neurodegenerativa.

O que tem dito Lacerda Sales:

 Acesso “é da responsabilidade do hospital”

O ex-secretário de Estado António Lacerda Sales afirmou que o acesso ao medicamento Zolgensma “é da responsabilidade do hospital” e não da tutela. “[O acesso] pertence à microgestão do hospital. Não interfere com a secretaria de Estado da Saúde. Não é o medicamento mais caro do mercado. Essa questão não vai à tutela, é da responsabilidade do hospital”, afirmou.

 “Não tinha possibilidades de me lembrar de que algo que aconteceu há quatro anos sem documentação”

António Lacerda Sales declarou que não tinha forma de se lembrar de “algo que aconteceu há quatro anos sem documentação”, invocando várias vezes o seu direito ao silêncio

“Essa pergunta é insultuosa. Não me lembrava. Não tinha possibilidades de me lembrar de que algo que aconteceu há quatro anos sem documentação. Os portugueses conhecem-me, porque estive três anos nas televisões a reproduzir a verdade”, respondeu a Joana Cordeiro, da IL, evocando o período da pandemia da covid-19.

Questionado na comissão parlamentar de inquérito sobre se os membros do Governo têm poder para intermediar casos como das gémeas que foram tratadas com o medicamento Zolgensma, o ex-governante afirmou que “todos os pedidos que chegassem formalizados (…) eram dirigidos às instituições”.

“São centenas de processos que acontecem normalmente. Os governantes não está lá para ajudar as pessoas? Não estão lá para ajudar os portugueses? Não é acesso preferencial. Ninguém passou à frente de ninguém. Um governante quando governa sabe quais são as linhas vermelhas que tem e os portugueses sabem bem o que passámos naqueles anos”, sublinhou.

 “O senhor Presidente da República nunca falou comigo sobre este caso”

O ex-secretário de Estado Adjunto e da Saúde declarou que “o senhor Presidente da República nunca falou comigo sobre este caso”, recusando também ter falado com António Costa ou Marta Temido sobre a situação destas crianças.

Lacerda Sales revelou ainda também que “nunca chegou nenhum e-mail nem nenhum processo formalizado” ao seu gabinete.

Questionado quanto a processos informais, o ex-secretário de Estado invocou o direito ao silêncio, tal como fez para várias outras questões que lhe foram colocadas, justificando com o facto de ser arguido e não querer “interferir na investigação” judicial.

“Eu nunca lhe disse que marquei a consulta”, indicou o antigo governante, afirmando também que “nunca disse que não tinha reunido com o filho do Presidente da República”.

António Lacerda Sales salientou que “ninguém passou à frente de ninguém, nem sequer há lista de espera”, reiterando que “foram tratadas até hoje 36 crianças” com o mesmo tratamento.

O que já se sabe:

O caso foi divulgado pela TVI, em novembro passado, e está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde já concluiu que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal.

Também uma auditoria interna do Hospital Santa Maria concluiu que a marcação de uma primeira consulta hospitalar pela Secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras neste caso.