Cientistas alertam para nova superbactéria resistente a antibióticos de último recurso 734

Cientistas alertam para nova superbactéria resistente a antibióticos de último recurso

20 de Novembro de 2015

Cientistas alertaram ontem para o «potencial epidémico» de uma bactéria mortífera e de rápida propagação, resistentes aos antibióticos ditos de «último recurso».

A nova super-bactéria, encontrada no sul da China, pode apagar quase um século de proteção garantida por antibióticos contra doenças mortíferas transmitidas por germes comuns como o E.coli, indicaram num estudo.

«Estes resultados são extremamente preocupantes», disse Liu Jian-Hua, professor na Universidade Agrícola do Sul da China, em Cantão, e um dos autores do estudo, citado pela “Lusa”.

Liu e os restantes autores descobriram um gene, apelidado MCR-1, que torna as bactérias resistentes a uma classe de antibióticos, conhecidos como polimixinas, e usados para combater as super-bactérias

O gene, detetado em bactérias comuns mas mortais como Escherichia coli (E.coli, também conhecido como colibacilo) e Klebselia pneumoniae (KPC), que causa pneumonia e doenças no sangue, torna estas bactérias invencíveis.

O MCR-1 permite à bactéria uma propagação fácil, de acordo com o estudo publicado pela “Lancet Infectious Diseases”.
 
Até agora, os raros casos de resistência ocorriam apenas através de mutações em organismos individuais, o que limitava fortemente a transmissão.

«As polimixinas eram a última classe de antibióticos que impediam a propagação de célula a célula», afirmou Liu.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) já advertiu que a resistência antimicrobiana pode resultar «num regresso a era pré-antibióticos», em que infeções de cura fácil podem ser fatais.

A maior parte das pessoas, entre 50 e 100 milhões, que morreram durante a pandemia da gripe de 1918, dez anos antes da descoberta da penicilina, foi morta por bactérias da pneumonia e não pelo vírus da gripe.

As superbactérias foram detetadas em análises de rotina de porcos e galinhas no sul da China. Os animais apresentavam bactérias resistentes à colistina, um antibiótico muito usado na medicina veterinária.

Isto levou os investigadores a examinarem a presença de E.coli e KPC em amostras, recolhidas durante quatro anos, em porcos e galinhas vendidos em dezenas de mercados de quatro províncias.

Analisaram também os resultados laboratoriais de doentes em dois hospitais nas província de Guangdong (sul) e Zhejiang (leste).

A baixa taxa de infeção nos seres humanos sugere que as superbactérias passam dos animais para as pessoas, sublinhou o estudo.

Embora atualmente esteja confinada à China, a bactéria MCR-1 pode «propagar-se mundialmente», acrescentou.

Especialistas que não estiveram envolvidos nesta pesquisa manifestaram forte preocupação.
 
«É um estudo preocupante, uma vez que as polimixinas são muitas vezes o antibiótico de último recurso para tratar infeções graves», disse Laura Piddock, professora de microbiologia na Universidade de Birmingham, no Reino Unido.

«Parece ser inevitável que a resistência às polimixinas seja acrescentada ao arsenal de bactérias resistentes a várias drogas e que se propague globalmente», afirmou Judith Johnson, especialista em patogénicos emergentes na Universidade da Florida (sul dos Estados Unidos).

O professor Timothy Walsh da Universidade de Cardiff, que colaborou no estudo, disse à BBC que os antibióticos poderão, em breve, tornar-se inúteis.

«Se o MCR-1 se tornar global – o que é um caso de “quando” e não “se” – e o gene se juntar a outros genes resistentes a antibióticos, o que é inevitável, então provavelmente teremos atingido o início da era pós-antibióticos», declarou.

Este estudo vai renovar o debate sobre o uso da colistina na pecuária, disseram os investigadores.

Na UE, a colistina é usada apenas na medicina veterinária. Mas na China é utilizada normalmente para promover o crescimento dos animais, especialmente nos porcos.

Cerca de 12 mil toneladas deste antibiótico são usadas anualmente na pecuária chinesa, de acordo com Marilyn Roberts, investigadora na faculdade de Saúde Pública da Universidade de Washington, em Seattle (oeste dos EUA).