(CNF24) Situações clínicas ligeiras: Ordem já expressou disponibilidade “para avançar com a regulamentação deste serviço” 57

O bastonário da Ordem dos Farmacêuticos (OF) enalteceu, ontem (dia 22), durante a sessão de abertura do Congresso Nacional dos Farmacêuticos 2024, “pela sua importância como medida de saúde pública, a mais recente medida do Ministério da Saúde: integrar as farmácias comunitárias no novo programa de prevenção e controlo da transmissão do VIH, através da dispensa exclusivamente por farmacêutico da Profilaxia Pré-Exposição ao VIH”.

Durante o seu discurso, Helder Mota Filipe foi referindo alguns dos principais temas e questões que preocupam e afetam os farmacêuticos, bem como impactam o seu trabalho. O NETFARMA selecionou os principais pontos

 

Despesa com medicamentos

Neste ponto, Helder Mota Filipe salientou que “temos uma despesa anual com medicamentos que continua a crescer. A nível hospitalar está mesmo, pela primeira vez, a crescer consistentemente a mais de 10% todos os anos, desde 2021”.

Uma vez que os medicamentos e outras tecnologias de saúde representam um peso cada vez maior nos orçamentos de cada um dos hospitais e no orçamento global da saúde, “só com rigor na avaliação, no financiamento e na utilização podemos contribuir para a sustentabilidade dos sistemas de saúde e para o acesso de todos os cidadãos às soluções terapêuticas mais avançadas, mais adequadas e mais ajustadas ao perfil de cada doente”.

 

Acesso a plataformas de dados

“Como farmacêuticos, temos de ser capazes de produzir cada vez mais dados, mais conhecimento, sobre as intervenções em saúde”, declarou o responsável, especificando que “de pouco servirá propormos mais e novos serviços, novas intervenções, se não existir evidência dos seus resultados e do valor em saúde que podem acrescentar. É fundamental haver capacidade e preocupação em medir os seus resultados de forma adequada”.

Neste sentido, Helder Mota Filipe reiterou a importância “do acesso dos farmacêuticos a plataformas de dados de saúde que sejam relevantes, para que, por um lado potenciem a qualidade e a segurança dos cuidados prestados, e por outro permitam o tratamento de informação e de dados fundamentais para a medição de resultados”.

O bastonário sublinhou que a Ordem “está fortemente empenhada e disponível para continuar a trabalhar no Registo de Saúde Eletrónico e em todas as outras soluções tecnológicas que promovam a partilha de dados, promovam o trabalho multidisciplinar e um melhor serviço aos utentes”.

 

A vacinação

Quando se fala em inovação na área da saúde, pensa-se com frequência nos medicamentos e dispositivos médicos. Não obstante, como alertou o bastonário, “a inovação está também relacionada com os serviços, com os cuidados prestados e com a relação com os doentes (e com os outros profissionais)”, sendo que, “provavelmente o serviço com maior visibilidade será, neste momento, a vacinação”.

A propósito da vacinação, o farmacêutico destacou “o contributo dos farmacêuticos comunitários, mais uma vez este ano, para a cobertura vacinal contra a gripe e a COVID-19 na população portuguesa. Há dois anos, não chegavam a 5 mil. Hoje temos mais de 7.500 farmacêuticos comunitários com a competência farmacêutica em administração de vacinas e medicamentos injetáveis ativa”.

Este serviço, “com elevado grau de utilização e satisfação por parte da população, tem permitido a administração de milhões de vacinas por farmacêuticos comunitários de forma segura nestas duas últimas campanhas de vacinação sazonal”.

Posto isto, como concluiu o responsável da OF, “o país sabe, e as autoridades de saúde também, que podem contar com os farmacêuticos para o sucesso dos programas de vacinação contra a gripe, contra a COVID-19 e de todas as outras vacinas para as quais seja efetivamente importante melhorar a proximidade, o acesso e a comodidade”.

 

Renovação da terapêutica crónica e dispensa em proximidade

A renovação da terapêutica crónica e a dispensa em proximidade de medicamentos e outros produtos de saúde prescritos para ambulatório hospitalar são dois outros exemplos “claros de serviços hoje estabelecidos, que os portugueses conhecem e reconhecem a sua vantagem”. Deste modo, para o bastonário, “a implementação destes serviços farmacêuticos é um exemplo de como, com vontade política e capacidade de coordenação, é possível desenvolver novas soluções a bem dos interesses dos cidadãos e da sociedade”.

Neste ponto, Helder Mota Filipe sublinhou ainda a relevância da mais recente medida do Ministério da Saúde de “integrar as farmácias comunitárias no novo programa de prevenção e controlo da transmissão do VIH, através da dispensa exclusivamente por farmacêutico da Profilaxia Pré-Exposição ao VIH”.

 

Intervir em situações clínicas ligeiras

Helder Mota Filipe declarou ainda que “as farmácias comunitárias, os laboratórios de análises clínicas e outras estruturas de saúde de proximidade podem e devem assumir maior responsabilidade na concretização das políticas de saúde junto das comunidades, contribuindo para a expansão de programas de prevenção, de rastreio e deteção precoce de doenças, com as vantagens que daí advêm para a obtenção de diagnósticos e intervenções mais precoces e para uma utilização mais eficiente dos recursos”.

Neste sentido, argumentou que “os farmacêuticos podem contribuir para diminuir a pressão nos cuidados e nas urgências do SNS. Intervindo, de forma segura e protocolada em situações clínicas ligeiras criteriosamente escolhidas, os farmacêuticos poderão resolver o problema desses utentes, evitando qua a sua resolução tenha de ser feita recorrendo a uma consulta no centro de saúde ou a um episódio de urgência.

De acordo com o responsável da OF, esta é já “a realidade em diversos países com sistemas de saúde desenvolvidos, e outros se preparam para a mesma abordagem”

Um estudo recente do Reino Unido refere que o” Programa Pharmacy First pode evitar 38 milhões de consultas e urgências no NHS, o que para a dimensão da população portuguesa, daria cinco milhões de consultas e episódios de urgência por ano”.

A “Ordem já expressou ao Ministério da Saúde a disponibilidade para avançar com a regulamentação deste serviço, com a definição de protocolos de intervenção, dispensa e referenciação dos utentes, num processo que deve envolver, naturalmente, a Ordem dos Médicos, para além das estruturas relevantes do Ministério da Saúde”, revelou Helder Mota Filipe.

 

 

Valorização dos profissionais

Por fim, o bastonário da OF fez referência às propostas da Ordem dos Farmacêuticos para o Orçamento de Estado para 2025, que estão “agora em discussão no Parlamento”.

Neste sentido, abordou a valorização dos profissionais de saúde e dos farmacêuticos em particular. “O SNS precisa urgentemente de definir e implementar uma estratégia de valorização dos seus profissionais de saúde”, declarou, acrescentando que “ao longo dos últimos dois anos, farmacêuticos hospitalares de quase duas dezenas de unidades de saúde do SNS apresentaram centenas de declarações de exclusão de responsabilidade, alertando para a insuficiência de recursos humanos e materiais nos seus serviços, cujo número e condições se tem vindo a degradar não permitindo o desempenho com a qualidade e a segurança máxima que a boa prática e a ética profissional exigem. Muito menos dar resposta ao número crescente de atividades e responsabilidades que são exigidas aos farmacêuticos do SNS”.

 

Carreira farmacêutica

“Temos finalmente uma carreira farmacêutica, diferenciada, que à época teve de ser negociada com a Saúde e com as Finanças, sob o compromisso da neutralidade orçamental”.  No entanto, de acordo com o bastonário, “já passaram mais de sete anos desde a sua criação formal. Já passaram 25 anos desde a última revisão da grelha remuneratória dos nossos colegas do SNS. Continuar a protelar esta injustiça é uma clara desconsideração e desvalorização dos farmacêuticos hospitalares e também dos farmacêuticos analistas clínicos e de genética humana que prestam serviço nos hospitais e outras instituições do SNS”, acusou.

Este é um problema dos farmacêuticos do SNS, “mas é também um problema de todos nós” e “dos outros profissionais que esperam uma intervenção ativa dos farmacêuticos nas equipas multidisciplinares. E é principalmente um problema para os doentes que têm o direito de ter acesso aos serviços farmacêuticos hospitalares como têm os cidadãos dos outros países desenvolvidos”.

Para o bastonário, “o limite aceitável foi há muito ultrapassado”.

 

Residência farmacêutica

Com a criação da carreira farmacêutica veio também o início da residência farmacêutica, com o SNS a assumir a formação de especialistas. “É uma mudança muito positiva e que, estou convicto, mudará, a médio prazo, para melhorar a realidade nos serviços farmacêuticos, mas também dos serviços de patologia clínica e de genética nos hospitais do SNS”, referiu o farmacêutico.

Mas só assim será “se forem garantidas, em cada serviço, as condições para uma formação em ambiente técnico, científico e humano adequados. A formação de especialistas não pode estar dependente da simpatia para com a existência ou coexistência num serviço hospitalar, como por exemplo em alguns serviços de patologia clínica”, alertou o responsável da OF.

Helder Mota Filipe chamou ainda a atenção para “a frequente desigualdade de oportunidades que enfrentam os farmacêuticos especialistas em análises clínicas, no acesso à direção de serviço e às escalas e ao regime de urgências”, assim como “é também importante que os hospitais deixem de continuar a contratar farmacêuticos como Técnicos Superiores de Saúde à margem da Carreira Farmacêutica. É um contrassenso”.

 

O Congresso Nacional dos Farmacêuticos 2024 decorre, desde o dia 21 terminando hoje (dia 23), no Centro de Congressos de Lisboa, sob o tema ‘Mais Inovação, Melhor Saúde’.