Após aquela que foi a maior campanha de vacinação contra a gripe dos últimos anos, especialmente no meio de uma pandemia, certamente que os farmacêuticos já demonstraram mais do que capacidade e competência para envergar num empreendimento desta dimensão que é a vacinação contra o coronavírus. O farmacêutico tem um extensivo treino, que todos os anos é renovado, em técnicas de administração de injetáveis assim como reagir em caso de reação anafilática; para além disto, o farmacêutico tem o conhecimento clínico necessário para aconselhar o utente numa época em que os movimentos anti-vacinação estão mais fortes do que nunca. É uma pena que só agora lhes tenha sido reconhecido o papel que podem ter na vacinação em massa contra o coronavírus. Os hospitais e centros de saúde estão há meses assoberbados com trabalho e à beira de colapso com profissionais de saúde exaustos; existem cada vez mais serviços que não estão a ser prestados, os tempos de espera para consultas são cada vez maiores, e o NHS (SNS inglês) está por um fio, pois todos os recursos foram redistribuídos para combater a pandemia. Por que não alocar farmacêuticos que trabalham por conta própria, por exemplo, para os centros de vacinação em vez de retirar médicos e enfermeiros dos hospitais e centros de saúde?
A decisão de incluir as farmácias no plano de vacinação não vem tarde, nem vem cedo. Muitas farmácias estão ainda a tentar recuperar do exigente último trimestre de 2020, com prestação de vacinação contra a gripe, preparação de medicação para o Natal e Ano Novo e mais uma vaga de casos positivos ao coronavírus que levou a mais um confinamento e às exigências que isso implica. Apesar de os farmacêuticos estarem impacientes por fazerem a sua parte, a verdade é que nem todas as farmácias não vão ter a infraestrutura para poderem providenciar o serviço de vacinação contra o coronavírus, seja em termos de espaço para o utente e de armazenamento, seja em termos de gestão de todo o trabalho. Para tal poder acontecer de forma segura, de forma a não negligenciar o restante trabalho e utentes, e a não causar mais um esgotamento no profissional de saúde, é necessário um bom planeamento assim como alocação de mais recursos por parte dos grandes grupos de farmácias. Uma possível solução seria agendar a vacinação para dias específicos: isto permite que não haja desperdício de vacina, assim como contratar um farmacêutico extra para apoiar no dia a dia da farmácia.
Esta decisão governamental mostra confiança nas farmácias e nos farmacêuticos, e nós não vamos desiludir nem recuar ao trabalho. No entanto, compete a cada um saber os seus limites e saber pedir ajuda antes de colapsar de exaustão e prejudicar-se não só a si, como à comunidade de utentes que tanto depende de nós. Vacinação em massa nas farmácias, sim, mas com “pés e cabeça”.
Silvana Martins
Pharmacist branch manager em Norwich, Reino Unido