Comunicação, alcance nacional e partilha de dados: Os desafios da dispensa em proximidade 1367

Onde, quando e em que moldes será feita a dispensa de medicamentos hospitalares em proximidade? Janeiro passado ficou marcado pelo primeiro passo na elaboração de uma norma profissional que definirá as condições e procedimentos desta medida, prevista no Orçamento do Estado para 2023 (OE 2023). O bastonário da Ordem dos Farmacêuticos (OF), Helder Mota Filipe, recebeu os presidentes dos Colégios de Especialidade de Farmácia Comunitária e de Hospitalar que, em entrevista ao Netfarma, levantam o véu deste desejo antigo a ganhar forma.

“Olhamos para esta medida com imensa responsabilidade, pela confiança depositada pelo Governo, consciente de que as capacidades profissionais dos farmacêuticos, aliadas à excelente rede de farmácias, serão a chave para o sucesso“, refere Carolina Mosca, presidente do Colégio de Especialidade de Farmácia Comunitária da OF. Relembra os projetos implementados nos últimos anos, em doenças como o VIH/Sida ou a esclerose múltipla, e garante que a “pandemia de Covid-19 tornou ainda mais premente a necessidade e acelerou estas práticas”.

A situação, continua, permitiu uma aproximação entre os farmacêuticos hospitalares e comunitários. Uma visão partilhada por João Ribeiro, presidente do Colégio de Especialidade de Farmácia Hospitalar, ao assegurar que “a pandemia veio provar que é possível, e o próprio Governo e Infarmed reconheceram que podia ser uma solução”.

“Os doentes têm que se deslocar para os hospitais onde são seguidos, muitas vezes fazendo longas distâncias”, reitera, como forma de apontar uma vantagem da medida. É aliada à “redução de faltas e ausências ao trabalho, aumento da produtividade, redução de stress familiar, melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, promoção da adesão à terapêutica, contribuindo para a efetividade do tratamento e minimizando as consequências clínicas associadas à não adesão para o doente e para o sistema de saúde”, acrescenta, por sua vez, Carolina Mosca.

Por outro lado, a medida apresenta desafios, sobretudo para os profissionais de saúde. Tanto João Ribeiro como Carolina Mosca admitem eventuais formações adicionais por parte dos farmacêuticos. O presidente do Colégio de Especialidade de Farmácia Hospitalar lembra que “existe um ato farmacêutico que deve ser financiado por parte da tutela”, e aponta a necessidade de reforço das equipas de farmacêuticos hospitalares já que “acaba por se consumir mais recursos”.

Já a presidente do Colégio de Especialidade de Farmácia Comunitária destaca “a qualidade do serviço, a proteção de dados pessoais e de Saúde, as boas práticas de distribuição e a segurança da pessoa com doença, que deve ser garantida”. Para Carolina Mosca, “é fundamental que a proximidade dos serviços não pare na farmácia” e que os farmacêuticos cheguem “até onde está a pessoa com doença que precisa de medicamentos, quer seja em casa, no ERPI (Entidade Residencial Para Idosos) ou numa unidade de cuidados continuados”.

Fundamental é também “o acesso a dados relevantes dos doentes pelos farmacêuticos”, a integração nos sistemas SPMS e o “cumprimento de procedimentos que garantam as boas práticas de distribuição em todo o circuito do medicamento”. A partilha de informação e o acesso a dados de saúde são “inevitáveis para o futuro, não faz sentido andarem as pessoas a ligar umas para as outras”, diz João Ribeiro.

Para que a dispensa de medicamentos hospitalares em proximidade seja uma realidade efetiva, é preciso que sejam ultrapassadas cinco fases. A primeira, onde hoje se encontra, de elaboração de uma norma profissional “ainda durante o primeiro trimestre deste ano”, seguindo-se a sua colocação em Consulta Pública, a aprovação pela Direção Nacional, a apresentação ao Ministério da Saúde, e a posterior aprovação pelo Executivo.

No mês passado, Helder Mota Filipe esteve reunido com Carolina Mosca e João Ribeiro para cumprir o primeiro e mais importante ponto da lista. Foram debatidos “os requisitos que os farmacêuticos consideram essenciais para poderem prestar o serviço de dispensa em proximidade de acordo com os mais rigorosos critérios de qualidade e segurança”, diz a representante Comunitária. Já o representante Hospitalar fala numa “orientação técnica para definir os requisitos da elegibilidade de tratamentos”, que revela não estarem fechados.

Cerca de 228 mil doentes crónicos tomam medicamentos dispensados na farmácia hospitalar. A título de exemplo, a Operação Luz Verde, uma iniciativa da OF com vários parceiros, realizou 8690 dispensas em 2275 farmácias comunitárias, em abril e maio de 2020. A esperança de ambos os farmacêuticos é que esta seja uma realidade generalizada e organizada, em prol dos doentes e de um tratamento mais cómodo.