Nos últimos meses vimos escritos diferentes artigos sobre a forma inapropriada como os portugueses utilizam os serviços de saúde. Independentemente de concordar com alguns dos argumentos utilizados há fatores que raramente são considerados e que observo fundamentais, o perfil de consumo em saúde, motivações e prioridades do doente.
Vários estudos mostram que as diferentes gerações têm comportamentos diferentes relativamente a prioridades de aquisição de produtos e serviços incluindo a saúde. O marketing utilizado pelas marcas em diferentes setores incentiva ao consumo, apostando numa presença constante da marca na vida do utilizador, com respostas quase imediatas, seja através de chatbots, call centers ou outro tipo de sistemas automatizados.
No entanto, na saúde esperamos que tudo seja diferente. Os nossos doentes ou nós quando estamos doentes teremos de entender a nossa doença, escolher o nível de cuidados que necessitamos, conseguir navegar o complexo processo administrativo para sermos atendidos nesse nível de cuidados e ainda só o podemos fazer no limite temporal justificado. Esta obsessão pela modulação do comportamento verifica-se sobretudo no Serviço Nacional de Saúde (SNS), como se essa fosse a chave mágica de resolução de todos os problemas.
Os novos modelos de prestação de cuidados de saúde advogam, uma medicina baseada da evidência, considerando as preferências do individuo e comtemplando a sua participação ativa no processo de decisão. Contudo, numa análise cuidada, ainda encontramos muito poucas ferramentas que facilitem essa tomada de decisão informada e auxiliem o utilizador no seu percurso. Uma ferramenta fundamental neste processo de decisão ativa é o pedido de segunda opinião. Apesar de devidamente comtemplado na lei, na minha experiência encontrei muitas barreiras a sua implementação, sobretudo se em situações que a doença é percebida como “pouco grave”.
A literatura aponta-nos que as prioridades dos utilizadores se centram na personalização dos cuidados, cobertura de cuidados de saúde abrangente e economicamente racional, cuidados de saúde com facilidades de acesso e digitalização de cuidados.
A evidencia e a sociedade mostram-nos que precisamos de olhar para a realidade da saúde com outra perspetiva, rompendo algumas das ortodoxias do setor de forma construir um modelo de prestação de cuidados de saúde que sirva as necessidades destas e das próximas gerações.
A digitalização dos cuidados é uma ferramenta fundamental que há semelhança do que aconteceu noutras áreas da sociedade pode facilitar a decisão informado do doente, acompanhar o doente no seu percurso no sistema de saúde e possibilitar uma resposta mais célere.
Para construirmos um sistema de saúde robusto temos que entender as necessidades, motivações e prioridades dos nossos dos utilizadores de hoje a amanhã, e avaliar as tecnologias disponíveis que permitem dar a melhor resposta possível a esses desafios.
Ana Luis Pereira, Médica Especialista em Medicina Geral e Familiar