Convenção Nacional da Saúde: Uma oportunidade para a mudança de paradigma? 807

A Convenção Nacional de Saúde acolheu o maior debate da saúde em Portugal. Dos vários assuntos discutidos os que me chamaram a atenção foram a criação do Pacto para a Saúde, o financiamento do sistema e a necessidade de implementar orçamentos plurianuais. Ora o avanço destas ações dar-se-á se houver uma transformação ao nível dos sistemas e dos seus propósitos, que visam fundamentalmente melhorar o nosso bem-estar e a vida em comunidade.

A teoria dos sistemas defende que a mudança sustentada das intervenções multissectoriais ocorre, muitas vezes, pela alteração das “regras do jogo” de um sistema. Autores propõem um Modelo de Níveis de Intervenção para analisar um sistema e, segundo a ordem que se apresenta, decrescem em complexidade e mudança sustentada: paradigma, objetivos, estrutura do sistema, feedback e atrasos e elementos estruturais.

A maioria das ações ocorre no nível dos elementos estruturais que afetam os subsistemas, atores e estruturas físicas traduzindo-se em formação e criação de espaços. No entanto, este é o nível menos eficiente para que hajam mudanças sistémicas inovadoras, contrariamente é no nível do paradigma que estas ações decorrem, como exemplo as estratégias multissectoriais. As intervenções no nível da estrutura do sistema visam melhorar as conexões entre os seus atores e, também, de desenvolver novas relações com outros elementos fora do sistema. Somente o estabelecimento de novas relações de interdependência, a introdução de novos atores ou a redefinição das fronteiras de atuação dos diversos atores do sistema irá permitir que as “regras do jogo” sejam alteradas. No fundo, se houver entrada ou saída de atores no sistema será necessário alterar o funcionamento do próprio sistema para que todas as partes consigam alcançar o seu propósito eficazmente.

Assim, na minha opinião, uma mudança de paradigma significa estáveis mudanças:
•    Holísticas, que ultrapassam as fronteiras habituais dos sectores, se definam como “todo o sistema” e sejam centradas no cidadão;
•    Estratégicas, que assentam na descentralização política e financeira das ações e no real envolvimento e colaboração dos parceiros entre os diferentes níveis de governação;
•    Na prevenção primária, fortalecendo a política nacional de saúde pública direcionada à implementação de estratégias multissectoriais no reforço dos determinantes sociais da saúde;
•    Na prevenção secundária, dando primazia a terapias inovadoras benéficas para o cidadão e para a sustentabilidade económica e social dos sistemas (por exemplo a imunoterapia no tratamento do cancro);
•    Nos planos de seguimento do cidadão, que sejam desenvolvidos pelo continuum de saúde permitindo ao cidadão caminhar pelo sistema de cuidados precisos, mas ao mesmo tempo e onde possível, um caminho padronizado de cuidados possibilitando ganhos em eficiência no próprio sistema e impacto na saúde e satisfação do cidadão.
Considero assim que o Conselho Nacional de Saúde pode estimular uma mudança progressiva de paradigma, se houver capacidade de negociação e adaptação por parte dos envolvidos. Gozar de boa saúde entre todos é impulsionar o desenvolvimento económico e social h(o)rmónico do nosso País.

Inês Tomás Rego,

(A coluna Notas da Nova é uma contribuição para a reflexão na área da saúde, pelos
membros do centro de investigação Nova Healthcare Initiative – Research. São artigos de
opinião da inteira responsabilidade dos autores)

Referências
1. Durham J. Schubert L. Vaughan L. Willis CD. Using systems thinking and the intervention level framework to analyse public health planning for complex problems: Otitis media in Aboriginal and Torres Strait Islander children. PLoS ONE. 2018. 13:3.
2. Swedish National Institute of Public Health. Ten years of Swedish public health policy – Summary report. 2013.
3. Wilkens J. Thulesius H. Carlsson C. The 2015 National Cancer Program in Sweden: Introducing standardized care pathways in a decentralized system. Health Policy. 2018. 120:12.