A Farmácia Moreno situa-se em plena baixa da cidade do Porto, uma zona com elevada afluência turística, de baixa densidade populacional residente, e com uma presença assinalável de pequeno comércio.
É uma zona que fervilha de atividade, pela remodelação apreciável de toda a envolvente urbanística, pela reconstrução do património edificado, pelo fluxo de turismo, pelo cruzamento de culturas, pelas gentes.
O fenómeno pandémico existente alterou toda esta dinâmica.
Alterou em primeira instância dimensões pessoais, infelizmente muitos, demais, não resistiram. Alterou a atividade económica, muitos negócios têm futuro incerto, se é que o têm, e claramente que as farmácias não passam incólumes.
A farmácia é, pela sua atuação em saúde, e bem, um dos poucos locais que tem de estar aberto. Que tem procura de clientes. No entanto esta pandemia tocou-nos de um modo violento em inúmeros aspetos, com diferentes valorizações, nenhuma desprezável;
- Do ponto de vista operacional a farmácia viu-se obrigada a adotar uma série de medidas visíveis e impactantes, como barreiras físicas, acessos condicionados, proteção adicional dos colaboradores, higienização mais constante. Julgamos que transversalmente nenhuma farmácia ficou indiferente, nenhuma farmácia ficou resignada, e, seguindo ou não os planos de contingência assegurados pelas associações sectoriais, adaptou o seu espaço e a sua operação.
- Do ponto de vista organizacional achamos adequado reestruturar a equipa de modo a ter em casa parte da equipa, para uma eventualidade menos positiva de um contágio, o que nos obrigou a rever o horário e os nossos serviços.
- Do ponto de vista económico sentimos um impacto brutal, com quebra de vendas muito acentuada, em valor e em número, muito assente nos residentes locais e com um cabaz diferente de produtos.
- Do ponto de vista social apercebemo-nos das limitações impostas aos cidadãos e da falta que sentimos em nos ligar a todos eles, nomeadamente à nossa comunidade, que é uma pedra basilar da atividade da nossa farmácia, uma farmácia comunitária. A preocupação pelos que estão mais isolados, pelos que vêm dificuldades económicas imediatas elevou-se.
- Do ponto de vista pessoal e familiar, pois também nós estamos mais expostos, acrescemos riscos aos nossos e também temos de encontrar diferentes rotinas.
Se a formação académica, e profissional, nos preparou para o potencial surgimento de epidemias ou mesmo pandemias, se no caso específico da Farmácia Moreno, o contacto com inúmeros turistas, nomeadamente chineses, antecipou alguns dos nossos movimentos, certo é que no contexto pré-pandémico, com as múltiplas atividades, com as diversas solicitações, com a procura constante de um serviço mais efetivo, mais produtivo, perdemos a noção do impacto de uma realidade diferente daquela que concebemos ao longo de uma vida. Não nos preparamos, enquanto unidade de saúde, enquanto sistema nacional de saúde e enquanto sociedade, adequadamente para o atual funcionamento.
Se é verdade que nesta primeira fase nos sentimos a sucumbir, e sucumbir em termos latos – organizacionais, económicos, sanitários, familiares, pessoais, talvez mesmo civilizacionais – verdade é que nos estamos a preparar para uma fase dois ou três com renovada força e fôlego, procurando ultrapassar este período menos positivo da nossa história, de modo a que rapidamente possamos retomar a nossa missão assistencial, tendo no entanto presente que muitas outras vertentes, nomeadamente sociais, são relevantes para estas novas etapas.
As farmácias e os farmacêuticos têm conseguido encontrar o seu espaço, apesar dos ataques despropositados e desmedidos de mais de uma década. Sentimos hoje, mais do que ontem, a nossa relevância na sociedade, com os mimos dos que nos querem, com o respeito de quem nos procura, com a proximidade, mesmo que distante, de muitos que ficaram mais confinados, com o apoio dos colegas hospitalares, distribuindo estes medicamentos junto dos que nos são mais próximos, com o reconhecimento das forças policiais, entre outros.
Enquanto setor sairemos mais fortes, enquanto profissionais mais preparados, o que nos dá muito alento para os novos desafios que se avizinham. Mas não estamos sozinhos, precisamos de TODOS, iniciando no cliente/doente, passando pelos diversos profissionais de saúde, pelas associações profissionais e sectoriais e não esquecendo as diversas entidades que nos tutelam. Estes últimos que nos devem posicionar como inquestionáveis parceiros, acautelando as condições do nosso funcionamento, integridade e a nossa independência, essencial para a qualidade de serviço que nos deve ser exigida.
João Almeida
Proprietário e Diretor Técnico
Farmácia Moreno – Porto