Desigualdades no acesso a cuidados paliativos pediátricos em Portugal 29 de Setembro de 2015 A pediatra oncologista Ana Lacerda defendeu ontem que é preciso acabar com as desigualdades no acesso a cuidados paliativos pediátricos, afirmando que as crianças com cancro e as que vivem em Lisboa e Porto são as que têm mais apoio.
«Existe uma desigualdade muito grande em termos de acesso em todo o país, as crianças com cancro são as que dispõem de mais apoio, de mais cuidados, e as crianças que vivem em Lisboa e no Porto», disse Ana Lacerda, que falava à agência “Lusa” a propósito das ‘Primeiras Jornadas de Cuidados Paliativos Pediátricos’, que decorrem entre quinta e sexta-feira em Lisboa.
Segundo o relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos Pediátricos, coordenado por Ana Lacerda, existem 44 serviços hospitalares no continente e quatro nas regiões autónomas que prestam estes cuidados.
O maior número de serviços situa-se no norte e na região de Lisboa e Vale do Tejo (15 em cada), seguido da região Centro (9), do Alentejo (4) e Algarve (1).
O relatório aponta que existe uma «desigualdade de acesso em termos de diagnóstico (apenas crianças com cancro, doenças respiratórias e necessidade de nutrição parentérica parecem beneficiar de tais apoios) e de local de residência».
Ana Lacerda advertiu que «é preciso atender a estas desigualdades e procurar que elas desapareçam e há muito por fazer efetivamente».
Para a médica, também «é urgente sensibilizar a sociedade e os profissionais de saúde para a importância de mudar o paradigma dos cuidados à criança com doença crónica complexa».
Estes cuidados «são sobretudo sobre a vida das crianças que vivem com doenças crónicas complexas e é sobretudo para isso que trabalhamos», frisou.
Estima-se que vivam em Portugal, pelo menos, 6.000 crianças com necessidades paliativas, destas, cerca de 200 morrem anualmente, a grande maioria no hospital.
«Os seus cuidados têm-se caracterizado por um foco excessivo na intervenção médica, centralização em hospitais terciários, fragmentação e ausência de coordenação, escassez de apoio domiciliário e psicossocial», salienta o relatório.
Contudo, existem algumas experiências (de articulação, de reorganização de serviços, de apoio domiciliário) que se têm revelado «sustentáveis e frutíferas» e que devem ser replicadas de «forma organizada», defende.
O relatório propõe um modelo para estes cuidados assente em «quatro pilares»: formação dos profissionais envolvidos nos cuidados de crianças com necessidades paliativas, promoção da prestação de cuidados domiciliários, reorganização das instalações pediátricas e a «articulação eficaz entre todos os prestadores de cuidados de saúde».
Defende também a criação de «unidades pediátricas que respondam de forma atempada e adequada às necessidades de internamento para capacitação ou descanso do cuidador, controlo de sintomas e fim de vida».
Para Ana Lacerda, é necessário «melhorar a formação de todos os profissionais para poder proporcionar às crianças cuidados de qualidade», a «par da necessidade das direções dos hospitais e dos serviços entenderem a necessidade imperiosa que existe neste momento de desenvolver estas equipas e estas unidades». |