“É incompreensível a forma como foi gerido pelas entidades oficiais o envolvimento dos farmacêuticos durante os dois anos de pandemia”, assinalou Helder Mota Filipe na sessão solene comemorativa do Dia do Farmacêutico e dos 50 anos da Ordem dos Farmacêuticos, que decorreu ontem à tarde no Mosteiro da Penha Longa, em Sintra. “Em diversas situações, a decisão final e afirmada de forma proativa foi não contar com a capacidade farmacêutica instalada até ao limite do possível”. Só então “foi solicitada a colaboração dos farmacêuticos, nomeadamente os comunitários e os analistas clínicos, mas também os hospitalares e da distribuição, de forma urgente e não programada”.
Num discurso marcado pelo seu agradecimento à classe farmacêutica, o bastonário reconheceu que, apesar das circunstâncias descritas anteriormente, os farmacêuticos demonstraram “uma disponibilidade e uma vontade quase sobre-humana, que permitiu continuar a assegurar aos nossos cidadãos os cuidados farmacêuticos necessários”.
A discussão da revisão da lei-quadro das ordens profissionais, a instituição da carreira farmacêutica no SNS e o desinvestimento na farmácia hospitalar foram outros pontos fortes do seu discurso.
Relativamente à primeira questão, o bastonário assinalou que a segunda versão de uma proposta de lei da autoria do Partido Socialista, embora ligeiramente mais atenuada do que a apresentada na legislatura anterior, mantém “aspetos inaceitáveis”.
Dando apenas dois exemplos, Helder Mota Filipe referiu que “coloca o foco das ordens na defesa dos interesses da profissão, desviando-as dos interesses dos destinatários dos serviços, como consta na lei atualmente em vigor”. Por outro lado, “cria o denominado ‘órgão de supervisão’ que se sobrepõe aos órgãos eleitos com poderes de regulamentação – poderes administrativos e também disciplinares – e que pode ser constituído por uma maioria de membros não eleitos diretamente e, ainda pior, a maioria dos membros pode ser constituída por não farmacêuticos”.
Sobre a instituição da carreira farmacêutica no SNS, o responsável admite que este foi, sem dúvida, “um passo muito importante”, mas encerra ainda “um conjunto de imperfeições, geradoras de injustiças para alguns colegas ao mesmo tempo que não protege os interesses do próprio SNS. Espero que possamos ter a urgente atenção da nova equipa ministerial, completando as negociações que decorriam com a equipa anterior”.
No próximo dia 29 de setembro realiza-se, pela primeira vez, a prova de ingresso na residência farmacêutica, à qual concorrem mais de 300 farmacêuticos para 149 vagas. Mas, apesar da criação da carreira farmacêutica, “as farmácias hospitalares enfrentam dificuldades sem precedentes de recursos humanos, equipamentos, materiais, infraestruturas”. De acordo com o bastonário, “o desinvestimento na Farmácia Hospitalar é um ataque direto à eficiência da gestão hospitalar e à eficiência dos cuidados prestados”.
O responsável da OF teve ainda uma palavra especial para a Farmácia Comunitária, “a face mais visível da profissão”, agradecendo “a capacidade que todos os dias tem de se reinventar e dar as respostas que os doentes precisam”.
Em resposta aos desafios e críticas do bastonário, o ministro da Saúde garantiu que conta com a participação mais vasta dos farmacêuticos, nomeadamente hospitalares, na gestão racional do medicamento, baseada em critérios técnico-científicos.
Relativamente à Farmácia Comunitária, Manuel Pizarro assegurou o seu compromisso de “organizar, de forma mais ativa, a distribuição em proximidade dos medicamentos de uso hospitalar, poupando muitas viagens difíceis a muitos doentes e muitas famílias e poupando também, por essa via, recursos ao Serviço Nacional de Saúde e ao Estado”.
Na agenda política continua também “a criação de mecanismos que agilizem a possibilidade de renovação da medicação crónica para tantos e tantos doentes, poupando tarefas que, a certa altura, do lado do sistema de Saúde, parecem mais burocráticas do que de outro teor”, e a “otimização das condições através das quais os farmacêuticos possam ter uma participação mais ativa na gestão da doença crónica”.
Apontando, por último, o facto de ter “a felicidade de herdar a carreira farmacêutica” mas “com alguns problemas” em termos da sua implementação, o titular da pasta da Saúde comprometeu-se a manter “uma porta aberta para o diálogo e a cooperação” com a Ordem dos Farmacêuticos, mostrando a sua convicção de que “aproximaremos as nossas posições”.