Especialista: Vacinação é um direito, mas também um dever 535

Especialista: Vacinação é um direito, mas também um dever

13 de Abril de 2015

Ana Leça, da Comissão Técnica de Vacinação, considera que as situações de resistência às vacinas são residuais, «o que não significa que não sejam preocupantes», e lembra que a vacinação é um direito, mas também um dever.

A propósito dos 50 anos do programa Nacional de Vacinação, que se assinalam este ano e serão objeto de uma cerimónia pública na terça-feira, Ana Leça disse à “Lusa” que «as taxas de cobertura vacinal demonstram que as situações de resistência à vacinação são residuais.

Isto «não significa que [as situações de resistência às vacinas] não sejam preocupantes», adiantou.

Para Ana Leça, «a vacinação no âmbito do PNV deve ser percebida como um direito do indivíduo a ser protegido, mas também como um dever de contribuir para a proteção da comunidade».

E explicou que, em Portugal, «uma criança não vacinada por opção dos pais pode estar protegida pela imunidade de grupo decorrente das elevadas coberturas vacinais».

Contudo, adiantou, essa criança «estará em risco se for viajar para países onde estejam a ocorrer surtos (muitos países europeus) e contactar com um caso».

Por seu lado, «uma criança não vacinada por opção dos pais que adquira sarampo, poderá transmitir a doença a outra criança que ainda não foi vacinada (com idade inferior a 12 meses, idade da primeira dose) e cujos pais pretendiam protegê-la da doença»

«Ou pode também transmitir à minoria de crianças já vacinadas mas que, por razões individuais, não adquiriram imunidade».

Na área da vacinação, «quando se alegam direitos de escolha individual, eles podem colidir com os direitos individuais dos outros e colidem certamente com o objetivo do PNV de proteção da comunidade».

Segundo Ana Leça, a resistência à vacinação iniciou-se com a primeira vacina, a da varíola.

A especialista, atualmente consultora da Direção-Geral da Saúde, refere que«a maioria dos jovens adultos apenas ouviu falar de doenças como a poliomielite, a difteria, e mesmo o sarampo, tendendo a desvalorizá-las».

Verifica-se, pois, uma «inversão da perceção do risco, com mais medo das vacinas do que das doenças, sem suporte científico válido e consistente».

Em relação ao sarampo, após um artigo publicado em 1998 na revista “Lancet” pelo médico inglês Andrew Wakefield, correlacionando a vacina VASPR com a doença inflamatória do intestino e com o autismo, assistiu-se a um aumento de pessoas a recusarem a vacina.

Esta relação entre as vacinas e as doenças foi desmentida, mas o seu efeito não foi travado. No Reino Unido, em 2003, a cobertura vacinal para a VASPR diminuiu para 80% nas crianças de dois anos, com aumento dos casos e surtos em vários locais.

Além do Reino Unido, assistiu-se a uma diminuição da cobertura vacinal em muitos países europeus, com a emergência de grandes epidemias de sarampo.

Em 2011 registaram-se mais de 30 mil casos em 36 países europeus, com nove óbitos, seis dos quais em França.

Este ano, «continuamos a assistir a surtos de sarampo na Europa e nos Estados Unidos, onde a doença se encontrava já controlada, não sendo cumprida a meta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de eliminar o sarampo no espaço europeu em 2015».