Estudo: Centros de saúde devem passar a ter um gestor do doente
21-Abr-2014
Os centros de saúde devem passar a ter um gestor do doente, que acompanhe o processo clínico do utente e faça a sua ligação aos cuidados hospitalares, segundo um estudo que foi posto em consulta pública na quinta-feira.
Baseando-se em recomendações internacionais, os autores do estudo calculam que, em Portugal, sejam necessários pelo menos cerca de 7.500 gestores do doente, sendo que cada um pode acompanhar perto de 80 casos de doentes crónicos.
«O conceito de gestor do doente que se propõe (…) consiste numa figura que acompanha personalizadamente o doente com condições clínicas e socioeconómicas complexas ao longo de um continuum de cuidados», refere o relatório do grupo de trabalho para a integração dos níveis de cuidados de saúde, a que a agência “Lusa” teve acesso.
Com o aumento da prevalência de doenças crónicas em Portugal, os autores do estudo consideram que há uma maior necessidade de um acompanhamento mais próximo e personalizado dos doentes.
O recurso a um gestor do doente nos cuidados de saúde primários pode ainda permitir uma redução da utilização dos cuidados hospitalares, refere o documento.
Pode conseguir-se alcançar uma diminuição dos internamentos desnecessários, reduzir a demora média, a recorrência à urgência e até a necessidade de cuidados continuados.
«A intervenção destes profissionais visa o acompanhamento dos doentes mais consumidores de recursos, permitindo assim a prazo controlar o desperdício através de um melhor controlo do estado do doente», diz o documento.
Ao gestor do doente cabe assumir o processo de referenciação do doente, coordenar os cuidados de saúde, garantindo a sua continuidade, assegurar a adesão terapêutica e promover o auto cuidado do doente, capacitando-o para uma gestão autónoma da sua doença.
O relatório recomenda que este gestor se encontre nos cuidados de saúde primários (centros de saúde e unidades de saúde familiar) e faça parte da equipa de saúde nos cuidados de primeira linha.
Em declarações à agência “Lusa”, o secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde considera que esta figura permite centrar nos cuidados primários o acompanhamento dos doentes.
«Para que o utente mantenha sempre uma âncora nos seus cuidados primários, com um gestor de cuidados que faça a ligação entre os vários agentes e entre os hospitais, se for caso disso», afirmou Fernando Leal da Costa.
Questionado pela “Lusa” sobre quem assumirá o papel de gestor do doente, o secretário de Estado disse que terá sempre de ser um profissional de saúde, podendo a função ser dividida ou partilhada entre enfermeiros e médicos.
No documento do grupo de trabalho, os autores salientam a importância de dar formação específica a quem vier a assumir aquele papel, justificando que o gestor do doente «requer um conjunto de competências técnicas, comportamentais e científicas (…) que transcendem a formação especializada em saúde».
O estudo refere ainda que têm de ser definidos critérios para o acompanhamento de doentes por um gestor, como seja o caso de doentes crónicos e de utentes com «propensão elevada para a utilização de recursos».
Segundo as recomendações internacionais que são citadas no relatório, um gestor do doente pode acompanhar entre 50 a 80 pessoas.
Aplicando o conceito apenas a um grupo de pessoas com mais de cinco doenças crónicas, seriam necessários aproximadamente 7.500 gestores.
O grupo de trabalho recomenda ainda a criação de um sistema nacional de referenciação de doentes entre as várias unidades de saúde, uniformizando os vários que já existem, dando origem apenas a um único sistema consolidado.
Unidades de saúde devem receber financiamento por cada utente
As unidades de saúde em Portugal devem passar a receber um pagamento fixo por cada utente, independentemente da quantidade de serviços a prestar, defende o mesmo documento.
Os autores consideram que os atuais modelos de financiamento promovem uma clara separação entre os vários níveis de cuidados (centros de saúde, unidades de saúde familiar, hospitais, cuidados continuados), propondo uma alteração a este regime.
Defendem, genericamente, que se passe de um sistema de pagamento baseado na produção para um modelo per capita.
«A capitação é um sistema de remuneração onde o médico ou unidade de saúde recebem um pagamento fixo por utente inscrito na sua lista (…). Trata-se de uma unidade predominantemente centrada na procura, sendo o financiamento estabelecido em função da dimensão da população previamente definida ou que o prestador escolheu», refere o documento, a que a agência “Lusa” teve acesso.
O grupo de trabalho para integração dos níveis de cuidados saúde para Portugal defende ainda que o pagamento per capita deve ser ajustado ao risco, ou seja, ter uma ponderação relativa face ao risco previsto que está associado a cada doente ou conjunto de utentes.
«O recurso à capitação ajustada pelo risco deverá incorporar uma componente baseada no desempenho institucional», com um conjunto de objetivos que deve ser partilhado entre os vários prestadores de cuidados de saúde.
Através desta medida, os autores do estudo propõe que se crie um pagamento per capita, mas que a remuneração tenha também em conta um conjunto de incentivos que devem ser comuns a várias unidades de cuidados de saúde.
É, assim, admitido que o pagamento per capita possa ser combinado com um pagamento pelos resultados alcançados.
«O atual modelo de financiamento de organizações de saúde no nosso país recorre à utilização de diferentes unidades de pagamento para os diferentes níveis de cuidados», lembra o relatório, considerando que desta forma nem sempre são criados os incentivos adequados para uma verdadeira integração dos cuidados de saúde.
O estudo defende que ao mudar o pagamento de produção para uma base per capita vai obrigar as instituições a mudarem a sua forma de funcionamento, «libertando-se do enfoque na resposta à doença para uma visão centrada no estado geral de saúde da população».
Antes de avançar para um modelo de financiamento por utente, o relatório diz que é necessário ter informação credível sobre a quantidade de população a servir por unidade de saúde e as características desses utentes.
Os autores defendem que o modelo de pagamento por capitação pode ajudar a eliminar a produção redundante e desnecessária nas várias unidades de saúde.