Quer-se mais dos farmacêuticos, mas não se quer dar mais aos farmacêuticos. O conteúdo deste “mais” é vastíssimo e já vai longa a sua discussão no decurso dos anos, mas vamos cingi-lo a “dados”, acesso dos farmacêuticos aos dados de saúde dos utentes.
“Dados relativos à saúde” são definidos no número 15 do Artigo 4º do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, na sua atual redação – Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril de 2016) – como os “…dados pessoais relacionados com a saúde física ou mental de uma pessoa singular, incluindo a prestação de serviços de saúde, que revelem informações sobre o seu estado de saúde”. No âmbito da sua atividade de prestadores de serviços de saúde, os farmacêuticos, por realização, por exemplo, de um teste COVID, vão ter acesso a informação sobre o estado de saúde do utente, informação essa que advém da prestação do serviço. Para tal, estes profissionais, cumprem com o disposto no número 11 do referido Artigo, o “Consentimento”, que se traduz numa … “manifestação de vontade, livre, específica, informada e explícita, pela qual o titular dos dados aceita, mediante declaração ou ato positivo inequívoco, que os dados pessoais que lhe dizem respeito sejam objeto de tratamento”. No ato de aconselhamento farmacêutico e/ou dispensa de medicamentos, os farmacêuticos têm acesso a dados relacionados com a saúde física ou mental, seja por auscultação do utente e consequente diagnóstico, seja por interpretação do receituário. Contudo, havendo de igual forma nesta situação, conhecimento de dados relacionados com a saúde do utente, já não se vê como necessário oficializar por escrito, a “manifestação de vontade” por parte do utente, eventualmente porque esses dados não serão “objeto de tratamento”. Perante esta realidade, e como sugerido durante o Webinar “Acesso dos farmacêuticos aos dados de saúde em discussão” organizado pelo Movimento para a Valorização da Profissão Farmacêutica, faz sentido ponderar no imediato, para os farmacêuticos, o acesso ao Registo de Saúde Eletrónico, onde consta informação clínica disponibilizada pelo utente e que, atualmente, se encontra apenas disponível para médicos e enfermeiros.
Numa perspetiva mais sustentada, colocando sempre o doente no centro do sistema de saúde, como preconiza o Programa do XXII Governo Constitucional e numa altura em que o Governo quer uma intervenção mais ativa dos farmacêuticos, seja (entre outros) na realização de testes de diagnóstico COVID, seja na continuidade da dispensa de medicamento hospitalares em proximidade, urge simplificar as operações e criar condições para dar mais aos farmacêuticos. Com as limitações óbvias e necessárias, é de extrema importância, conseguir-se tão breve quanto possível, não só, o acesso aos dados clínicos, mas também, a permissão de registo, por parte do farmacêutico, das suas intervenções no processo do doente.
Documentos consultados: Projeto de Proximidade (Relatório) – SNS – Grupo de trabalho, outubro de 2020; Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril de 2016
Célia Alves da Silva
Farmacêutica