Fim da comercialização da olanzapina (IM): uma decisão (des)económica?* 1160

Desde 2001 que se encontra disponível no mercado português o antipsicótico olanzapina na formulação para administração intramuscular (IM),  o qual é utilizado em meio hospitalar para os casos de agitação psicomotora, primordialmente em doentes com esquizofrenia e doença bipolar. Este medicamento é dos mais utilizados por ter um efeito calmante, sedativo e com poucos efeitos adversos.

No entanto, no passado mês de Fevereiro o Infarmed informou que este antipsicótico irá deixar de estar disponível, uma vez que foi indeferido o pedido de revisão excepcional do preço1 de 4,82€ para 21,60€ (um aumento de cerca de 348%). Esta decisão foi tomada com base nas alternativas existentes no mercado (haloperidol e largactil), que de acordo com o Infarmed, permitem um tratamento eficaz dos doentes com um custo inferior.[1]

Após este comunicado, várias críticas têm surgido sobretudo ao nível clínico, afirmando que o medicamento em causa tem menos efeitos adversos, quando comparado com as alternativas existentes, permitindo uma maior estabilidade do doente e uma recuperação mais eficaz. Adicionalmente, também se afirma que esta decisão é um “retrocesso de 30 anos na psiquiatria de urgência” dado que se passa de um tratamento mais recente e de primeira linha para opções cuja síntese reporta aos anos 60.[2]

Será que esta decisão se irá reflectir em menores custos para o SNS?
Com base em estudos clínicos, provou-se que os tratamentos alternativos mencionados pelo Infarmed (nomeadamente o haloperidol) são mais baratos que os tratamentos com olanzapina, tendo ambos a mesma eficácia.[3] Adicionalmente, não há evidência que o tratamento com olanzapina esteja associado a tempos de internamento mais curtos quando comparado com o uso do haloperidol.[4] Desta forma, a evidência sugere que as alternativas existentes no mercado poderão reflectir-se numa redução de custos para o SNS. Mas será que evitam prejuízos para o doente?

Estudos clínicos mais recentes têm vindo a alertar para os efeitos adversos do uso do haloperidol.[5] Alguns países, tais como os Estados Unidos da América e Inglaterra, têm guidelines que alertam não só para os efeitos secundários do haloperidol, como aconselham o uso da olanzapina para os primeiros surtos da doença e para doentes sensíveis aos efeitos adversos do haloperidol, que se podem manifestar de forma aguda e logo após a primeira administração do fármaco. A percepção dos clínicos que utilizam diariamente estes fármacos é de que estes efeitos adversos são tanto mais comuns quanto maior a fragilidade e comorbilidade dos doentes a quem são administrados. Consequentemente, estes efeitos secundários não deverão ser ignorados.

Quais as consequências destes efeitos em termos económicos?
A resposta a esta questão torna-se central uma vez que se o tratamento dos efeitos secundários tiver um custo superior à disponibilização da olanzapina, então a decisão do Infarmed poderá traduzir-se em custos adicionais para o SNS. No entanto, nenhum estudo inferiu os custos associados ao tratamento destes efeitos induzidos pelo uso do haloperidol.

Apesar dos tratamentos alternativos serem mais baratos, sem diferenças substanciais quanto à sua eficácia, os seus efeitos secundários não podem ser ignorados, uma vez que podem constituir uma externalidade negativa da medida agora adoptada.

Desta forma, e para uma decisão económica completa, dever-se-á não só perceber se o aumento do preço cobre a alteração dos custos de produção na sua exacta medida, como também se deve considerar os diferentes custos de externalidade associados aos efeitos adversos.

1 A farmacêutica alegou aumento dos custos de produção deste medicamento.

Referências:
[1] Infarmed: http://www.infarmed.pt/portal/pls/portal/docs/1/10660333.PDF
[2]NotíciaRTP:http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=803693&tm=8&layout=122&visual=61
[3]Freeman DJ, DiPaula BA, Love RC, Intramuscular haloperidol versus intramuscular olanzapine for treatment of acute agitation: a cost-minimization study. Pharmacotherapy, 2009
[4]Leung JG, Amanda MB, Lawrence AF, et al. Comparison of short-acting intramuscular antipsychotic medication: impact on length of stay and cost. Am J Ther. 2011; 18(4):300-4
[5]Bosanac P, Hollander Y, Castle D, The comparative efficacy of intramuscular antipsychotics for the management of acute agitation. Australasian Psychiatry, 2013, 21(6):554-62.

Maria Ana Matias

(A coluna Notas da Nova é uma contribuição para a reflexão na área da saúde, pelos membros do centro de investigação Nova Healthcare Initiative – Research. São artigos de opinião da inteira responsabilidade dos autores.)

* Texto escrito ao abrigo do anterior acordo ortográfico