As notícias das últimas semanas foram marcadas pelos incêndios florestais que ocorreram um pouco por todo o país, mas principalmente na zona de Pedrogão Grande, concelho de Leiria.
No rescaldo dos acontecimentos, a discussão gira em torno de tópicos relacionados com a origem do incêndio, os meios disponíveis para combate às chamas, as dificuldades de acesso a determinadas áreas ou consequências ambientais. Um tema não menos importante, mas que não tem por hábito fazer parte da discussão, prende-se com os efeitos diretos dos fogos florestais na saúde da população. Dada a dimensão atingida pelos recentes fogos florestais, esta torna-se uma questão de saúde pública.
Em termos dos efeitos ao nível da saúde física dos indivíduos, estes estão essencialmente relacionados com a exposição e consequente inalação de fumos. Para além de vapor de água e gases, o fumo proveniente de incêndios florestais contém pequenas partículas tóxicas, capazes de entrar nas vias respiratórias, habitualmente denominadas compostos orgânicos irritantes.
Mais concretamente, entre os efeitos a nível respiratório encontram-se exacerbação de asma e doença pulmonar obstrutiva crónica, bronquite, pneumonia e deterioração da função pulmonar. Frequentemente estes efeitos traduzem-se num aumento do volume de atividade hospitalar, que pode prolongar-se até cinco semanas após o evento. [1]
O sistema cardiovascular também é afectado pelo fumo proveniente dos fogos florestais, principalmente em indivíduos que sofrem de doença cardiovascular, pois a presença de monóxido de carbono na corrente sanguínea pode exacerbar a sua condição. [3] Na Austrália e na Califórnia, duas regiões onde regularmente ocorrem fogos florestais de grandes dimensões, a taxa de indivíduos admitidos nas urgências com problemas cardiovasculares, e as respectivas taxas de mortalidade, são mais elevadas durante o período em que um fogo está ativo na região.
Os fogos florestais podem ainda produzir impactos ao nível oftalmológico, dermatológico, bem como problemas relacionados com o excesso de calor, fruto da exposição a temperaturas elevadas.
Contudo, nem todos os indivíduos são afectados de forma semelhante, havendo grupos da população que são mais vulneráveis. No que toca aos efeitos dos fogos florestais ao nível da saúde física, estes grupos são constituídos por crianças, idosos, grávidas, bem como doentes cardíacos e respiratórios. [2,3]
Os efeitos mencionados nos parágrafos anteriores têm lugar essencialmente no curto prazo, sendo que muitos deles se verificam mesmo durante o período em que o fogo florestal se encontra ativo. A evidência relativamente a efeitos de longo prazo é escassa. [3]
Da mesma forma, não é clara a extensão geográfica onde se podem esperar consequências dos fogos florestais para a saúde da população. As pequenas partículas tóxicas que compõem o fumo originário de incêndios florestais são capazes de viajar no ar durante tempo suficiente para serem inaladas por populações localizadas a grande distância do local afectado. [4]
Relativamente a efeitos ao nível da saúde mental, note-se que os fogos florestais frequentemente causam danos como sendo a destruição de propriedade, habitações ou mesmo a morte de membros da comunidade. O grau de exposição de este tipo de situação pode ter consequências em termos de saúde mental. Estas incluem condições como depressão, stress pós-traumático ou ansiedade e têm um carácter mais longo prazo. [1]
Importa, acima de tudo, não descurar o apoio e prestação de cuidados às populações afetadas pelos fogos. No recente caso de Pedrógão, estas populações são compostas essencialmente por indivíduos considerados vulneráveis. Monitorizar de perto o seu estado de saúde física e mental, mesmo após o fogo ter sido extinto, é essencial.
Referências:
[1] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3492003/
[2] https://www.dgs.pt/saude-ambiental-calor/incendios-riscos.aspx
[3] https://www3.epa.gov/airnow/wildfire_may2016.pdf
[4] http://www.phac-aspc.gc.ca/hp-ps/eph-esp/fs-fi-c-eng.php
Ana Moura,
Tilburg University