Gestão da farmácia no verão: Dos stocks aos recursos humanos. Conheça a experiência de quatro colegas 969

O verão pode ser uma das épocas do ano que mais desafios traz às farmácias em termos de gestão, seja de recursos humanos ou de categorias.

O NETFARMA falou com vários farmacêuticos para perceber quais os seus principais desafios, nesta altura, e o que costumam fazer para os evitar ou ultrapassar.

 

Farmácias Reis Barata: Monitorização do KPI ‘Tempo de espera’

Eunice Reis Barata, farmacêutica e proprietária das Farmácias Reis Barata, costuma tirar férias “no verão, e durante o ano também. Sempre o fiz, mesmo quando tinha só uma farmácia”. Para a farmacêutica, as férias são mesmo “uma injeção de energia: adoro trabalhar, mas gosto igualmente de tempo de pausa, seja para me divertir ou para não fazer nada”.

E costuma ir de férias “descansada porque trabalho com pessoas muito responsáveis e que partilham comigo o gosto pelo trabalho e pela vida. Ninguém chateia ninguém durante as férias, todos nos substituímos, e trabalhamos num ambiente de muita confiança. É num terreno de confiança que se consegue crescer”.

Distribuir as férias ao longo do ano

“Temos regras para que este período decorra com normalidade, para que não haja diminuição do nível de serviço aos utentes, mas também para que não haja sobrecarga dos profissionais que estão a trabalhar”, declara Eunice Reis Barata.

Deste modo, revela que “privilegiamos que as pessoas distribuam as férias ao longo do ano. Não temos qualquer limite de duração máxima ou mínima, temos mesmo alguns elementos mais jovens que gostam de tirar três ou quatro semanas de seguida, de viajar, e outros que querem ir ao país de origem… Há liberdade para cada um gozar as férias como gosta”.

Em contrapartida, “asseguramos um número máximo de pessoas de férias em simultâneo, um número bastante baixo, para que a equipa não esteja a trabalhar no limite, porque na realidade o período de ‘férias de verão’ é bastante longo, e se as equipas estiverem no limite, no fim das férias do pessoal estarão a precisar de outras férias”.

Esse limite é definido “pela gerência em conjunto com a direção técnica”, refere a responsável, acrescentando que “raramente temos mais de duas pessoas que tenham a mesma função de férias ao mesmo tempo. Mesmo em equipas grandes”.

Armazenistas mantém a frequência 

A gestão dos produtos está muito facilitada, segundo a farmacêutica “pela excelência da cadeia de abastecimento das farmácias. Os armazenistas continuam servir-nos com a frequência do restante ano e mesmo os laboratórios que encerram umas semanas não têm impacto no bom funcionamento das farmácias”.

Existem “duas categorias de produtos de saúde com uma sazonalidade evidente nesta altura: os protetores solares e os repelentes; e uma categoria de medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM), que são os medicamentos para distúrbios gastrointestinais, mais prevalentes no período estival. Mas nenhum deles pode faltar na farmácia durante o ano”.

Conselhos para se fazer a gestão da farmácia

Há três pontos de que Eunice Reis Barata não prescinde, que são:

  1. “Monitorização do KPI ‘Tempo de espera’ – meço durante todo o ano e neste período não é exceção. Não me guio pela perceção do tempo de espera, ele é medido a cada hora em cada farmácia. Este é um ponto crítico na satisfação dos utentes, e por isso focamo-nos muito nele.
  2. “Manutenção de todos os serviços da farmácia – administração de injetáveis, fazer um teste de streptococcus, realizar um mapa ou fazer a preparação individualizada da medicação, são serviços que o utente espera das nossas farmácias. E por isso preocupamo-nos em manter também o acesso a estes serviços, nos mesmos horários”.
  3. “Firmeza nas regras de marcação de férias para todos poderem ir de férias descansados”.

 

Farmácias Tanara: Correta gestão e otimização das equipas

 O verão é “apenas um dos vários desafios, visto haver picos de vendas em várias alturas. Temos também uma grande afluência na altura de regresso às aulas ou nas semanas anteriores ao natal. Mas sem dúvida de que o verão é uma altura bastante importante a nível de vendas versus gestão de pessoal”, confessa Paula Reis, fundadora e CEO do Grupo Referencial, ao qual pertencem as Farmácias Tanara, acrescentando que “a receita será uma correta gestão e otimização das equipas e dos respetivos recursos existentes”.

Face ao modelo de gestão adotado, a farmacêutica sublinha que “não temos grandes necessidades de ajustes em termos de pessoal. Temos uma equipa dinâmica e experiente, que trabalha diariamente em equipa, num excelente ambiente de trabalho”.

Fazer pré-aprovisionamento

Para Paula Reis, os principais desafios estão relacionados com “gerir todo o trabalho entre atendimento, exposição e back-office”.

No que toca à gestão de categorias, defende que “deve ser feita com a antecedência e não sobre a estação. Mensalmente devemos ter o mês seguinte ao corrente, devidamente aprovisionado de stock. Ter a resposta preparada é, sem dúvida, um alívio para as nossas pessoas.”

Por isso, mesmo a época de verão sendo sinónima de “aumento da afluência por certas categorias de produtos”, uma das prioridades é “aprovisionar o stock certo. Isto porque garantir a satisfação dos clientes é a nossa prioridade”.

Assim sendo, na prática, no relativo ao sortido de produtos, “é raro termos ruturas, pois fazemos pré-aprovisionamento”. Nesta época do ano, “temos sempre os protetores, pós solares e bronzeadores, que são uma das cinco categorias mais importantes. Embora, no que toca aos protetores solares, estes devam ser utilizados em qualquer altura do ano”.

Paula Reis salienta ainda que é, igualmente, “importante reforçar o stock de produtos da categoria de digestão e flora intestinal, cicatrização, primeiros socorres e repelentes de insetos. São produtos com sazonalidade mais marcada”.

Mudar o paradigma

Por fim, Paula Reis alerta que “os clientes ainda associam muito farmácia a medicamentos, quando comercializamos muito mais do que isso. É preciso mudar este paradigma e o próprio canal, e isso demora o seu tempo. É necessário mudar mentalidades (em primeiro lugar) e depois formar as equipas para as especificidades dos vários produtos”.

Assim sendo, “podemos já ser considerados os especialistas do medicamento (e é bom que assim seja!), mas podemos ser também especialistas em outras categorias”.

Nas Farmácias Tanara, “como parte integrante do Grupo Referencial, trabalhamos diariamente, para entregar cada vez mais serviços diferenciados aos nossos clientes”, sendo, por exemplo, “o serviço dedicado e personalizado de dermocosmética um deles”.

 

Farmácias Silveira: Assegurar stocks

João Silveira, farmacêutico e elemento da direção das Farmácia Silveira, costuma “tirar sempre 15 dias de férias nas duas últimas semanas de julho” e confessa que “adoro trabalhar no mês de agosto para planear o ano”. Durante as suas férias, está “sempre contactável e vou respondendo às dificuldades/desafios que vão aparecendo”. Aliás, para o farmacêutico, o problema é que “por vezes não desligo”.

O desafio de delegar

A principal dificuldade que sente em termos de gestão nesta época do ano “é ter a equipa à ‘tangente’, porque todos os colaboradores querem tirar férias no verão”, por isso, admite que “se acontece alguma coisa, ficamos ‘debaixo de água’”.

Já em termos da gestão de categorias, “o principal desafio é delegar noutra pessoa essa gestão, ou seja, ter outra pessoa preparada para a função”.

Não faltar pessoas nem produtos

Em termos de medidas para preparar os meses de verão, João Silveira refere que, nas Farmácias Silveira, não se costuma tomar “nenhuma em particular, pois os nossos diretores técnicos ou substitutos asseguram que não faltam pessoas nem produtos”, sendo imprescindível, contudo, assegurar stocks de “solares e repelentes de mosquitos”.

 

Gestão de recursos humanos: Planear com antecedência

Portugal é um país onde “tradicionalmente a generalidade das férias são marcadas ou desejadas para o período de verão, fruto das características costeiras e do clima do nosso país”, refere Telmo Silva, coordenador geral das Farmácias da Terra, acrescentando que “é muitas vezes difícil conciliar o desejo de férias de todos os colaboradores com a necessidade de cobertura dos horários de funcionamento, assegurando a prestação de igual qualidade de serviço”.

Além disso, o sector apresenta “agora dificuldades transversais no recrutamento e retenção de profissionais, o que agudiza essa dificuldade”, destaca o farmacêutico.

Por outro lado, a tipologia e localização da farmácia, segundo o coordenador, “pode trazer um aumento da procura, com um aumento de clientes”, mas também pode “assistir-se a uma diminuição do número de atendimentos neste período. Portanto, a natureza das dificuldades varia em função das características da própria farmácia”.

Sendo a gestão dos recursos humanos da farmácia, efetivamente, um dos maiores desafios na época de verão, Telmo Silva deixa alguns conselhos e sugestões.

Principais desafios 

Conciliação de Interesses: “É necessário conciliar as preferências de férias dos colaboradores com as necessidades da farmácia.”

Manutenção da Motivação: “Garantir que a equipa se sinta valorizada e motivada, mesmo em períodos mais intensos, seja pelo aumento da procura, seja pela diminuição dos recursos disponíveis, o que muitas das vezes reflete uma carga de trabalho superior em parte dos colaboradores.”

Gestão de Stresse: “O aumento do trabalho pode levar ao stresse e à sobrecarga dos colaboradores, sendo fundamental tentar garantir um equilíbrio adequado do binómio trabalho/vida pessoal de todos os colaboradores. Este é um dos fatores que pode conduzir a níveis de satisfação mais elevados, diminuindo a rotatividade das equipas, e contribuindo para a motivação geral que, tradicionalmente, se traduz em maior produtividade”.

Aspetos a considerar 

Planeamento Antecipado: “É fundamental começar a planear as férias com antecedência, envolvendo a equipa. Muitas vezes não é um tema consensual, pelo que o envolvimento da equipa na definição dos períodos de férias e na valorização dos inputs dados para a definição das regras para esse planeamento é fundamental para uma maior aceitação e uma maior motivação para um período muitas vezes mais difícil de gerir no quotidiano da farmácia.”

Comunicação: “Manter uma comunicação aberta e transparente com a equipa é essencial. Representa papel de maior importância, quer nas dificuldades ou necessidades da própria farmácia, quer dos critérios para a marcação, como períodos preferenciais, prioridades na escolha, sobreposições, entre outros. Não conseguindo muitas vezes unanimidade nesta definição, é obrigatório que os critérios sejam percecionados como claros, justos e equitativos.”

Flexibilidade: “É importante ser flexível e adaptar os horários conforme as necessidades. Seja na alteração de turnos, seja sobretudo na capacitação dos diferentes elementos da equipa para diferentes tarefas e responsabilidades, de forma a assegurar a sua execução com a mesma qualidade ou padrão na ausência do tradicional responsável.”

Reconhecimento: “É importante valorizar o esforço e a dedicação da equipa, especialmente em momentos desafiadores como os períodos de férias.”

Conselhos para gerir as férias da equipa 

Planeamento: “Elaborar um calendário de férias com a antecedência possível, procurando ir ao encontro das preferências dos colaboradores e partindo da análise de frequência e movimento da farmácia nesses períodos.”

Comunicação Transparente: “Manter a equipa informada e envolvida nas decisões tomadas.”

Flexibilidade: “Procurar estar disposto a fazer ajustes conforme necessário e que a equipa mostre o mesmo espírito.”

Delegação de Tarefas: “Planear antecipadamente a delegação de tarefas e as ferramentas de capacitação para a sua execução, para aliviar a carga de trabalho individual e assegurar o normal funcionamento.”

Valorização da Equipa: “Reconhecer o esforço de todos, procurando a promoção de um bom ambiente de trabalho.”

Para alcançar estes objetivos o coordenador costuma fazer:

– “Reuniões regulares com a equipa para discutir as necessidades e expectativas de todos.”

Sistema de escalas rotativo, sendo que “implementei um sistema de escalas rotativo na prioridade para marcação de férias para garantir a justiça na distribuição das férias”.

– “Oferecer incentivos para quem se mostre mais disponível para trabalhar em períodos de maior necessidade. Aqui, é importante olhar às motivações individuais de cada um. Há quem valorize mais o tempo livre, enquanto outros uma remuneração adicional, pelo que ter um plano que possa incluir diferentes modalidades de valorização é importante.”

Em suma, tendo em conta o referido, para uma gestão mais tranquila no verão, é importante planear e ser flexível, sobretudo ao nível dos recursos humanos, estabelecer regras para que não haja diminuição do nível de serviço aos utentes e sobrecarga dos profissionais, reforçar stocks, sobretudo de repelentes e solares, e ir delegando tarefas.