Governo: OM fez «interpretação errada» de portaria sobre cuidados primários 23 de junho de 2014
O Ministério da Saúde (MS) considerou que a Ordem dos Médicos (OM) faz uma «interpretação errada» quando entende que uma portaria publicada este domingo pretende substituir os médicos do trabalho por médicos de família.
Na sexta-feira, a Ordem dos Médicos anunciou que vai dar instruções aos clínicos para se recusarem a realizar consultas de medicina do trabalho, conforme está determinado num diploma que entrou ontem em vigor.
«A portaria não é cumprível e não vai ser aplicada. É mais uma das várias iniciativas legislativas do Ministério da Saúde que não vão ser aplicadas», disse então à “Lusa” o bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva. Adiantou que «a Ordem dos Médicos vai dar indicações no sentido de não cumprirem e não se sentirem coagidos a fazê-lo».
Uma portaria publicada, que entrou em vigor no dia 22 de junho, regula a possibilidade de a promoção e vigilância da saúde a determinados grupos de trabalhadores – independentes, de serviço doméstico, agrícolas sazonais, aprendizes de artesãos, pescadores e funcionários de microempresas – pode ser assegurada através de unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
José Manuel Silva justifica a decisão com o facto de esta não ser uma das competências dos médicos de medicina geral e familiar, considerando que ao cumprir o diploma, os profissionais estão a «extravasar o limite das suas competências», violando o código deontológico, nos pontos 1 e 2 do artigo 36.
Na resposta, o MS contrapõe que a portaria em causa é a «regulamentação» de um artigo de uma lei de 10 setembro de 2009 e que «os médicos de família apenas continuarão a fazer o que já fazem, seguindo os utentes da sua lista que não têm médico de trabalho, nem condições para o terem».
«Nada mais do que isto. Não se altera o quadro funcional de nenhuma das especialidades reconhecidas pela OM», diz uma nota do MS enviada à Agência “Lusa”, observando que a portaria dirige-se a «um universo limitado de utentes que já não frequentam serviços de Medicina do Trabalho e apenas são seguidos em Cuidados Primários».
O MS alega ainda que a portaria dos Cuidados Primários de saúde foi elaborada de acordo com parecer e acompanhamento da Direção-Geral de Saúde, pelo que se «estranha» as acusações de «desnorte» proferidas pelo bastonário sobre o diploma em causa.
Acentua também que a legislação em vigor segue recomendações da Organização Mundial de Saúde e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), garantindo, agora também, que os médicos de cuidados primários, sem ultrapassarem as suas competências, possam emitir documentos que atestem o estado de saúde de trabalhadores.
Ao insurgir-se contra o diploma, o bastonário lembrou que «a medicina do trabalho é uma carreira específica que não pode, por portaria, passar a ser desempenhada por um profissional de outra carreira», pelo que seria o mesmo que «decidir por portaria que um médico de medicina interna passava a operar doentes».
Para o bastonário esta é mais uma decisão que vem demonstrar que «o Ministério da Saúde está completamente desnorteado».
Além disso, argumenta com a falta de tempo dos médicos de família, que «estão cheios de utentes e com problemas gravíssimos no sistema informático».
José Manuel Silva sublinha que a Ordem é favorável e apoia a existência de medicina do trabalho nos centros de saúde para trabalhadores liberais e de microempresas, mas desempenhada especificamente por esses profissionais. |