Um projeto de investigação que tem como objetivo a identificação de perfis específicos de microbiota e metabolitos que possam prever melhores terapêuticas para os doentes com Espondilartrite (SpA) e a Artrite Reumatoide (AR) foi o vencedor da Bolsa Nacional para Projetos de Investigação, que distinguiu o melhor trabalho de investigação em Microbiota Humana na Saúde e na Doença, atribuída pela Biocodex Microbiota Foundation. Os dois investigadores da NOVA Medical School | Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa que assinam o trabalho, a Prof.ª Doutora Ana Faria e o Prof. Doutor Fernando Pimentel-Santos*, vão receber 25 mil euros para desenvolverem o projeto.
A Espondilartrite (SpA) e a Artrite Reumatoide (AR) são duas das doenças reumáticas inflamatórias crónicas mais comuns, com uma prevalência na população portuguesa de 1,6% e de 0,7%, respetivamente, segundo dados do estudo EpiReumaPt1. Apesar das manifestações clínicas e o decurso da doença serem heterogéneos, estas doenças levam a danos irreversíveis nos ossos e nas articulações, que se traduzem por perda substancial da qualidade de vida.
De acordo com os vencedores da Bolsa, o estudo permitirá contribuir para um melhor entendimento de alguns mecanismos fisiopatológicos relacionados com o início da doença e, sobretudo, verificar se existe um perfil de microbiota que possa estar associado à resposta terapêutica. “O que poderemos perspetivar é uma otimização da prescrição da terapêutica permitindo selecionar a melhor opção para o doente em termos individuais. Evita-se perder tempo e expor os doentes a efeitos secundários de terapêuticas inúteis. Em termos societários teremos uma melhor utilização de recursos”, sublinham os vencedores da Bolsa de Investigação.
A introdução terapêutica dos inibidores do fator de necrose tumoral (TNFi) tem permitido o controlo da inflamação, mas nem sempre da progressão estrutural”. Apesar disso, os investigadores explicam que “uma grande percentagem de doentes (cerca de 40%) não responde ou apresenta efeitos adversos a esta terapêutica”. Daí que considerem urgente encontrar fatores preditores de resposta à terapêutica.
Partindo do pressuposto de que estes doentes têm uma microbiota distinta, o objetivo deste projeto “é avaliar a influência da microbiota na resposta à terapêutica com TNFi” e, simultaneamente, “perceber de que forma as terapêuticas biológicas modulam a microbiota nestes pacientes”.
Os perfis de microbiota associados a AR e SpA são conhecidos. Em fases pré-clínicas de AR foi descrita uma dominância de espécies de Prevotella. Em doentes com espondilite anquilosante foi recentemente descrita uma elevação de Steptococcus e uma diminuição de espécies com propriedades anti-inflamatórias (Faecalibacterium prausnitzii e Clostridium) em doentes com aumento de calprotectina (um marcador de inflamação intestinal). Alterações no microbiota são, como mostra a evidência científica, uma constante nestas doenças multifatoriais2,3.
A Bolsa Nacional para Projetos de Investigação 2019/2020 distinguiu o melhor projeto de investigação em Microbiota Humana na Saúde e na Doença, teve 32 candidaturas que foram avaliadas por um júri independente constituído pelos membros do Comité Científico da Biocodex Microbiota Foundation (BMF) em Portugal.
TEMA BOLSA 2020/2021
A Biocodex Microbiota Foundation definiu o tema para a Bolsa de Investigação 2020/2021, destinada a projetos de investigação em microbiota. O júri escolheu o tema “Microbiota Gastrointestinal e Sistema Imunitário”. De acordo com o regulamento, disponível em www.biocodexmicrobiotafoundation.com, vão poder candidatar-se os clínicos ou investigadores que trabalhem em instituições científicas e tecnológicas portuguesas. Ao projeto vencedor será atribuído um financiamento de 25 mil euros.
* AUTORES DO PROJETO VENCEDOR:
Prof. Doutora Ana Faria – Professora Auxiliar na NOVA Medical School|Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. Áreas de especialização: modulação da microbiota, disfunção metabólica, componentes bioativos da dieta com efeito na obesidade e neuroinflamação.
Prof. Doutor Fernando Pimentel-Santos – Professor Auxiliar de Medicina/Reumatologia do Mestrado Integrado em Medicina da NOVA Medical School|Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa e Investigador Principal do Centro de Estudos de Doenças Crónicas (CEDOC-NMS). Reumatologista do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, Hospital Egas Moniz.
Referências
1 – Branco JC, Rodrigues AM, Gouveia N, Eusébio M, Ramiro S, Machado PM, da Costa LP, Mourão AF, Silva I, Laires P, Sepriano A, Araújo F, Gonçalves S, Coelho PS, Tavares V, Cerol J, Mendes JM, Carmona L, Canhão H. Prevalence of rheumatic and musculoskeletal diseases and their impact on health-related quality of life, physical function and mental health in Portugal: results from EpiReumaPt – A national health survey. RMD Open. 2016 Jan. 19;2(1):e000166. doi: 10.1136/rmdopen-2015-000166. eCollection 2016. PubMed PMID: 26848402; PubMed Central PMCID: PMC4731842.
2 – Maeda Y, Takeda K. Host-microbiota interactions in rheumatoid arthritis. Exp Mol Med. 2019 Dec 11;51(12):1-6. doi: 10.1038/s12276-019-0283-6. Review. PubMed PMID: 31827063; PubMed Central PMCID: PMC6906371.
3 – Klingberg E, Magnusson MK, Strid H, Deminger A, Ståhl A, Sundin J, Simrén M, Carlsten H, Öhman L, Forsblad-d’Elia H. A distinct gut microbiota composition in patients with ankylosing spondylitis is associated with increased levels of fecalcalprotectin. Arthritis Res Ther. 2019 Nov 27;21(1):248. doi:10.1186/s13075-019-2018-4. PubMed PMID: 31771630; PubMed Central PMCID:PMC6880506.