Identificado circuito cerebral fundamental para a rejeição sexual 45

Mamíferos fêmeas, como os roedores, aceitam tentativas de acasalamento apenas durante a fase fértil e uma equipa de investigadores da Fundação Champalimaud (FC) descobriu um circuito neural fundamental para a rejeição sexual fora do ciclo reprodutivo.

“A rejeição sexual não é apenas a ausência de recetividade; é um comportamento ativo”, explica, em comunicado,  Susana Lima, autora sénior deste estudo e investigadora principal do Laboratório de
Neuroetologia na FC, acrescentando que “as fêmeas exibem ações defensivas, como fugir, dar pontapés ou golpear o macho. Queríamos compreender como é que o cérebro alterna entre esses dois estados comportamentais tão drasticamente diferentes”.

No centro desta investigação está o hipotálamo ventromedial (VMH), uma região do cérebro, do ponto de vista evolutivo, antiga que controla o comportamento social e sexual em várias espécies, incluindo os humanos.

A equipa focou-se na área anterior do VMH, uma zona menos explorada, particularmente nas células sensíveis à hormona progesterona, que varia ao longo do ciclo reprodutivo. “Estes neurónios são ideais para estudar como o cérebro feminino alterna entre aceitação e rejeição durante o ciclo”, comenta o primeiro autor do estudo Nicolas Gutierrez-Castellanos, citado, igualmente, em comunicado.

Através de técnicas avançadas como a fotometria por fibra — que monitoriza a atividade cerebral em tempo real, medindo sinais de cálcio — os investigadores registaram a atividade desses neurónios sensíveis à progesterona em fêmeas recetivas e não recetivas durante interações com machos.

Os resultados foram impressionantes: os neurónios no VMH anterior tornaram-se extremamente ativos em fêmeas não recetivas, correlacionando-se com ações defensivas, como pontapés e golpes, mas foram muito menos ativos em fêmeas recetivas.

“Parece que os neurónios sensíveis à progesterona no VMH anterior atuam como guardiões da rejeição sexual”, diz a coautora Basma Husain, acrescentando que “quando a fêmea está fora da sua janela fértil, esses neurónios tornam-se muito ativos, desencadeando a rejeição. Mas durante a fase fértil, a sua atividade diminui, permitindo o acasalamento”.

 

Botões de Duplo Controlo no Cérebro

Como é que esses neurónios alternam entre ativação e inibição, dependendo da fertilidade? Para investigar, a equipa realizou experiências de eletrofisiologia, medindo a atividade dos neurónios sensíveis à progesterona em fatias de tecido cerebral.

“Descobrimos que em fêmeas não recetivas, estes neurónios recebiam mais sinais excitatórios, aumentando a probabilidade de serem ativados”, explica Gutierrez-Castellanos.  O investigador explica que “Em fêmeas recetivas, eles recebiam mais sinais inibitórios, reduzindo a probabilidade de disparo. É uma prova da flexibilidade e adaptabilidade das conexões neurais no hipotálamo — e no cérebro em geral”.

O equilíbrio entre “níveis de atividade e excitação/inibição dos neurónios sensíveis à progesterona no VMH anterior é um forte indicador do seu papel na rejeição sexual”, afirma Husain. Para confirmar esta situação, de acordo com a investigadora, usamos optogenética para ativar seletivamente esses neurónios com luz”. De facto, a estimulação artificial destes neurónios durante a fase fértil induziu comportamentos de rejeição, como pontapés e golpes. “É como acionar um interruptor — mesmo estando férteis, as fêmeas comportavam-se como se não estivessem”.

Por outro lado, ao silenciar esses neurónios com um composto químico em fêmeas não recetivas, a equipa observou uma redução nos comportamentos de rejeição; contudo, não as tornou totalmente recetivas — indicando que duas populações distintas de neurónios, uma controlando a rejeição e outra a recetividade, trabalham em conjunto para produzir o comportamento apropriado conforme o estado interno da fêmea.

“Este sistema dá ao cérebro dois ‘botões’ de ajuste”, explica Lima. “É uma forma mais eficiente e robusta de o cérebro equilibrar esses comportamentos, garantindo que o acasalamento ocorre quando a fertilização é mais provável, ao mesmo tempo que minimiza os riscos e custos do acasalamento, como a exposição a predadores ou doenças”.

Husain acrescenta: “Este sistema dual provavelmente confere flexibilidade à regulação do comportamento sexual pelo cérebro. O sexo não é determinista. Mesmo durante a fase recetiva, uma fêmea ainda pode rejeitar os machos, portanto, a capacidade de recorrer a ambos os conjuntos de neurónios pode permitir comportamentos mais dinâmicos e diferenciados”