Um dos aspetos cruciais para o desenvolvimento da Medicina é a existência de polos de formação e investigação que dinamizam todo o tecido da saúde, criando continuamente um estímulo de progresso, de diferenciação e de motivação para todos os parceiros envolvidos. Os Centros Académicos Clínicos (CACs), envolvendo hospitais, faculdades e institutos de investigação, dão formação a milhares de estudantes de medicina e de internos e asseguram também a formação contínua pós-graduada de muitos profissionais de saúde espalhados pelo país. São também o fulcro da investigação médica, a qual tem vindo a privilegiar a colaboração entre clínicos, clínicos-cientistas e cientistas não clínicos, promovendo por um lado a aproximação da descoberta científica à prática clínica, e por outro impulsionando a investigação clínica focada em perguntas baseadas nas necessidades do dia a dia e ensaios clínicos que respondam às necessidades dos doentes. Para esta realidade é fundamental o ecletismo de recursos humanos e tecnológicos e uma colaboração estreita dos parceiros da investigação médica, numa associação virtuosa de ciência e prática clínica.
A estrutura dos CACs associa-se a um conceito de treino médico e de prática clínica em estreita ligação à investigação científica. Os jovens que estamos a treinar para liderar a medicina na segunda metade do século XXI devem “crescer” na cultura do método científico. O ensino médico deve estimular a pergunta em vez de privilegiar a reprodução de respostas. Os futuros médicos devem aprender a conviver com a complexidade da ciência médica e a adaptar-se às incertezas das franjas do conhecimento. Têm igualmente de se preparar para lidar com a inteligência artificial no suporte à decisão médica e com novas formas de explorar a imagem em medicina, que se encontram neste momento em várias fases de desenvolvimento e expansão e que geram elas próprias mais dúvidas do que certezas.
É relevante salientar que os CACs transportam em si benefícios diretos e indiretos para um conceito de saúde sustentável:
1) O componente académico dos CACs baseia-se em estratégias de financiamento privado e internacional, essencialmente independentes do estado;
2) A internacionalização que caracteriza a atividade científica das estruturas académicas dos CACs constitui uma oportunidade de atualização permanente de toda a estrutura prestadora de cuidados de saúde dos CACs;
3) As estruturas académicas dos CACs têm os recursos necessários para desenvolver projetos de pesquisa avançada de dados clínicos (“dados clínicos de vida real”) com grandes vantagens para o progresso do conhecimento médico;
4) Os CACs têm maior capacidade para elevar o patamar de participação em ensaios clínicos, quer numericamente, quer qualitativamente.
O conceito dos CACs tem um enorme potencial para o desenvolvimento dos cuidados de saúde, do treino dos médicos e da ciência médica. O potencial científico e tecnológico das faculdades e dos institutos de investigação que participam nestes CACs poderá ser traduzido em inovação na saúde, expressa em benefícios tangíveis sociais e económicos.
Estes são os ingredientes adequados para que a medicina em Portugal evolua no sentido de prestar cada vez melhores cuidados de saúde nas próximas décadas.
João Eurico Cabral da Fonseca
Diretor da Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa, e Presidente Executivo do Júri do Prémio Inovação em Saúde