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Investigação portuguesa está «excessivamente» dependente do Estado

26 de Janeiro de 2015

Um estudo realizado pelos cientistas Carlos Fiolhais e Armando Vieira concluiu que o sistema de Investigação e Desenvolvimento (I&D) português «parece estar excessivamente dependente do Estado».

Os dois investigadores, num estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, questionam a sustentabilidade do sistema de I&D português, considerando que «os jovens doutorados, formados em número significativo, constituem uma mão-de-obra especializada que não encontra acolhimento no tecido empresarial português, vendo-se em muitos dos casos forçados a emigrar».

De acordo com o estudo, intitulado “Ciência e Tecnologia em Portugal – Métricas e impacto (1995-2011)”, citado pelo “i”, «as empresas, em parte por falta de conveniente perceção dos respetivos responsáveis, não têm conseguido aproveitar e canalizar para benefício de mais gente as mais-valias» da formação de profissionais qualificados.

Os investimentos públicos realizados, «sobretudo em formação de recursos humanos, acabaram por não ser absorvidos pelo sistema económico», aponta o estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Apesar de observarem essa dependência do Estado, Carlos Fiolhais e Armando Vieira consideram que «seria um erro diminuir o investimento público em ciência», defendendo que tem de haver «alguma inteligência na colocação desse investimento».

Na análise, os autores também recaem sobre a atual política durante a crise, considerando que esta está «a ter consequências na ciência, sendo claro que foi interrompido nos últimos anos o ciclo de crescimento na parcela de I&D, tanto público como privada».
 
A «abrupta» descida do número de bolsas atribuídas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia em 2014 e o corte «de praticamente metade das unidades de investigação após um processo sumário de avaliação» são alguns dos exemplos dessa mesma política, apontam.

Os autores frisam que «o discurso governativo sobre a ciência tem oscilado entre a defesa da “excelência” (um conceito que nunca foi precisado) e a referência à necessidade de reforço da “ligação às empresas” (que não é acompanhada da indicação do modo de concretizar esse reforço)».
Nas conclusões do estudo, são apontados vários pontos fracos ao estado da ciência e tecnologia em Portugal, como o «reduzidíssimo número de pedidos de patentes [11 por um milhão de habitantes face às 102 por um milhão da média europeia]», pouco investimento em startups, fraco peso do emprego em atividades em tecnologia e baixa atratividade de investimento estrangeiro para atividades de ciência e tecnologia.

Como pontos positivos da evolução da ciência e da tecnologia em Portugal entre 1995 e 2010, os cientistas registam «a convergência nos parâmetros que medem I&D face à média da União Europeia», criação de “boas infra-estruturas”, «número significativo de unidades de I&D bem classificadas em avaliações internacionais» e o «crescimento da produção científica nacional».
 
Este retrato do sistema científico nacional vai ser apresentado e discutido na segunda-feira, no Centro Ciência Viva, da Universidade de Coimbra, pelas 18:00.