
Os vegetarianos que consomem ovos e laticínios estão menos protegidos contra a perda de massa muscular e a razão pode estar na toma de suplementos sem aconselhamento.
Um estudo, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), “vem mostrar que têm de existir, em Portugal, orientações especificas para as pessoas que querem adquirir certos padrões alimentares. O vegetarianismo está largamente a aumentar. E não há nada de mal nisso se for planeado corretamente, salvaguardando os desequilíbrios nutricionais”, defendeu a professora Elisa Keating, citada pela Lusa.
Na base deste alerta estão os resultados do VeggieNutri, um estudo publicado na revista científica Nutrients que está a ser desenvolvido na FMUP desde 2022, com o objetivo de avaliar a qualidade das escolhas alimentares de vegetarianos e não vegetarianos.
Os resultados indicam que a dieta vegetariana, que inclui ovos, leite e derivados e exclui a carne, pescado e derivados (ovolactovegetariana), está associada a uma maior percentagem de massa gorda (mais 4%) e a uma menor percentagem de massa muscular (menos 2%) quando comparada com a dieta omnívora, que inclui produtos de origem vegetal e animal.
Já os veganos, apesar consumirem menos proteínas, tinham mais massa muscular, uma conclusão que surpreendeu a equipa de investigação.
“Estávamos à espera (…) que quem tivesse menos massa muscular fossem os veganos e percebemos que os ovolactovegetarianos têm maior massa gorda”, descreveu a investigadora.
Elisa Keating descreveu à Lusa que “para tentar perceber esta conclusão, a equipa comparou os grupos e percebeu uma diferença muito importante: o perfil de suplementação vitamínica e mineral”.
“Os veganos, como nós esperávamos, são aqueles que fazem mais frequentemente suplementação com vitamina B12 [vitamina recomendável nos veganos porque vem dos alimentos de origem animal]. Os ovolactovegetarianos, surpreendentemente, mesmo não havendo orientações de saúde para tal, mostram maior prevalência de suplementação de ferro”, descreveu a docente e coordenadora do estudo.
No VeggieNutri, os investigadores analisaram características como o sexo, a idade, o estado metabólico e nutricional, bem como os estilos de vida numa amostra de mais de 400 voluntários saudáveis, com idades entre os 18 e os 64 anos.
Descrito pela FMUP como o primeiro estudo em Portugal a comparar os efeitos da adoção de diferentes dietas na composição corporal e em parâmetros de saúde metabólica, este estudo sugere associações entre suplementos nutricionais, inflamação e menor massa muscular.
Por exemplo, a suplementação com ferro, mais frequente nos ovolactovegetarianos, pode associar-se a uma maior inflamação sistémica e, não se refletindo num melhor estado nutricional de ferro, poderá contribuir para o agravamento da diminuição da massa muscular induzida pela menor ingestão proteica na dieta.
Esta conclusão faz “soar alarmes”, acrescentou a também investigadora e nutricionista Cátia Pinheiro, contando que “a prevalência da procura de aconselhamento nutricional é bastante baixa”.
“E em causa estão suplementos de venda livre. Podemos encontrá-los em qualquer superfície comercial. O facto destes suplementos serem tomados com base em pouco ou nenhum aconselhamento nutricional deve soar alarmes. É de facto uma preocupação”, referiu.
Aproveitando para recomendar a presença de nutricionistas nos cuidados de saúde primários, as investigadoras alertam para a falta de literacia global neste tema, apontando que perceberam até que há pessoas que não sabem sequer dizer especificamente qual o seu padrão alimentar.
“Há também muitos mitos que as pessoas assumem e a escolha do padrão alimentar sem aconselhamento reflete-se em desequilíbrios”, sublinhou Elisa Keating.
Cátia Pinheiro acrescenta: “As pessoas não estão empoderadas o suficiente para decidir o que é saudável ou não e precisam do apoio de especialistas”.
A equipa do VeggieNutri é composta por investigadores da FMUP, RISE-Health, Laboratório Associado RISE, entre outras instituições de ensino e investigação.