O laboratório farmacêutico Servier foi declarado culpado pela justiça francesa de “engano agravado” e de “homicídio e lesões involuntários” no caso Mediator, um dos maiores escândalos de saúde em França.
O grupo, um dos maiores e mais poderosos laboratórios de França, acusado de ter escondido os efeitos colaterais do medicamento Mediator, foi igualmente condenado a uma multa de 2,7 milhões de euros.
“Apesar de conhecerem os riscos envolvidos durante muitos anos, (…) nunca tomaram as medidas necessárias e assim enganaram” os consumidores do medicamento Mediator, declarou a presidente do Tribunal Criminal de Paris, Sylvie Daunis.
A sentença surge mais de 10 anos depois do início da polémica em torno do medicamento Mediator, um fármaco introduzido no mercado em 1976 como um complemento no tratamento de diabéticos, mas que seria frequentemente utilizado como um inibidor do apetite por pessoas que desejavam perder alguns quilos.
O medicamento – um derivado de anfetamina – foi comercializado entre 1976 e novembro de 2009 (mais de três décadas) e terá sido tomado por cerca de cinco milhões de pessoas, apesar das suspeitas associadas a possíveis insuficiências cardíaca e pulmonar.
Segundo uma perita judicial, o fármaco estará na origem de lesões graves nas válvulas cardíacas e de uma hipertensão arterial pulmonar, uma patologia rara e fatal, e poderá ter sido responsável por várias centenas de mortes.
Um estudo datado de 2010 chegou a apontar para até 2.000 vítimas mortais, enquanto outros dados indicaram que milhares de pessoas desenvolveram problemas de saúde incapacitantes e permanentes.
Condenado a pagar uma multa de 2,7 milhões de euros, o grupo farmacêutico francês Servier foi absolvido, no entanto, da acusação de “fraude”.
Jean-Philippe Seta, o antigo “número dois” da farmacêutica e antigo “braço direito” do líder dos laboratórios Jacques Servier, que morreu em 2014, foi condenado a quatro anos de prisão suspensa.
Ainda no âmbito deste processo, a Agência Nacional de Segurança de Medicamentos (ANSM) francesa, que foi acusada de passividade e de não ter agido para evitar a morte e graves consequências nos pacientes, foi condenada a uma multa de 303.000 euros por ter “falhado gravemente na (sua) missão de reguladora sanitária”.
O caso, que demorou mais de 10 anos para chegar a tribunal, envolveu mais de 6.500 demandantes.
O tribunal de Paris demorou quase três horas para ler o veredicto na íntegra, por ser muito longo, de acordo com as agências internacionais.
Este mediático julgamento decorreu ao longo de 10 meses, entre 2019 e 2020, e quase 400 advogados trabalharam no caso.
O Mediator foi retirado do mercado francês em 2009, dois anos depois do primeiro aviso de alerta e muitos anos após ter deixado de ser comercializado em Espanha e na Itália. No Reino Unido e nos Estados Unidos, o medicamento nunca foi autorizado.