A esperança de vida à nascença de um português é hoje em dia de 77 e 83 anos, conforme seja do sexo masculino ou feminino (dados do INE para o período de referência 2012-2014). Em 1920 um português ou portuguesa poderia esperar viver apenas 36 ou 40 anos. Ou seja, passado quase um século, a esperança de vida mais do que duplicou. É preciso ter em atenção que estes valores são calculados assumindo que as condições de mortalidade observadas no ano de nascimento se irão manter inalteradas ao longo da vida. Mas na realidade, ao longo das últimas décadas, tem-se observado um declínio sustentado das taxas de mortalidade. Logo, se este declínio se mantiver no futuro, a esperança de vida será bastante mais elevada do que é hoje. Num estudo recentemente publicado pelo INE, Coelho e Nunes, analisam em detalhe a evolução da mortalidade em Portugal desde 1950. A década em que se observa um maior aumento da esperança de vida é a de 1970-1980. Para além dos habituais suspeitos que contribuem para a redução da mortalidade ao longo de todo o período, como sejam a melhoria das condições de vida e das infraestruturas, melhores níveis de educação, novos tratamentos e medicamentos, são apontados os impactos de políticas públicas na área da saúde como sejam o plano nacional de vacinações introduzido na década anterior, medidas de apoio à saúde materna e infantil nos anos 70 e a criação do Sistema Nacional de Saúde. No entanto, para o futuro, existe já evidência de que as origens dos ganhos de longevidade serão muito diferentes das do passado. Por exemplo, na década mais recente voltou a observar-se uma aceleração do aumento da esperança de vida em Portugal (+3,1 e +2,4 anos para homens e mulheres, entre 2003 e 2013). Mas enquanto no século XX as melhorias eram sobretudo consequência de reduções de mortalidade infantil e jovem, no século XXI as reduções de mortalidade verificam-se sobretudo em idades mais avançadas. Será que a esperança de vida dos portugueses continuará a melhorar a este ritmo? É possível. De facto, apesar da tendência de aumento se ter mantido durante mais de um século, quando nos comparamos com outros países europeus são possíveis identificar vários atrasos que podemos recuperar. A esperança de vida dos homens continua abaixo da média europeia. E apesar das taxas de mortalidade nas idades jovens estarem alinhadas com a média europeia, existe ainda uma diferença significativa nas idades adultas e nos mais idosos. Também ao nível das causas de morte é possível identificar situações em que uma convergência para a média europeia é possível. Tal como nos outros países europeus, as doenças do aparelho circulatório são hoje em dia a primeira causa de morte em Portugal (cerca de 30% em 2013 de acordo com dados da DGS). Apesar da respetiva taxa de mortalidade se ter vindo a reduzir desde os anos 90, o valor está ainda acima da média europeia em particular no caso das mulheres. A segunda causa de morte é por tumores, com valores relativamente mais estáveis nas últimas décadas. Mas ao contrário do que acontece noutros países com esperanças de vida mais elevadas, não se verifica ainda em Portugal que a redução de mortalidade mais recente, derivada em especial da redução da mortalidade por doenças do aparelho circulatório, esteja a ser compensada pelo aumento da mortalidade por tumores. Em terceiro lugar temos as doenças do aparelho respiratório com flutuações ao longo do tempo mas com taxas de mortalidade muito acima da média da Europa. Claro que Portugal deverá também beneficiar dos últimos avanços da medicina, a nível de novos tratamentos e medicamentos. Há diversos anos que se investigam substâncias que permitem prolongar a vida de forma saudável. Por exemplo, a FDA dos EUA aprovou recentemente a realização de testes clínicos para verificar se o aumento da vida verificado em animais devido à administração da metformina, um medicamento muito popular e barato utilizado no tratamento do diabetes tipo 2, também pode ser replicado em humanos. Outro fármaco, a rapamicina, utilizado como imunossupressor, também já mostrou resultados positivos em testes com ratos. Num recente artigo de março de 2016, Ilia Stambler, apresenta uma lista das várias investigações em curso na comunidade científica, várias delas promovidas pela indústria farmacêutica, na busca de terapias anti-envelhecimento. Os desafios que Portugal irá enfrentar nas próximas décadas são muitos e a promessa de uma vida mais longa só por si não garante uma vida melhor. Quando perguntamos aos portugueses se estão satisfeitos com a sua vida, os resultados são dececionantes. De acordo com dados do EUROSTAT calculados a partir do inquérito à qualidade de vida da população realizado em 2013, os portugueses apresentavam um dos níveis de satisfação com a vida mais baixo (6,2 numa escala de 0-“nada satisfeito” a 10-“completamente satisfeito”) entre os vários países europeus, apenas à frente da Sérvia e da Bulgária. Outro resultado relevante desse inquérito é que a satisfação varia inversamente com a idade, ou seja, quanto mais velho se é menos satisfeito se está. As tendências demográficas já estão traçadas. De acordo com o INE (2014), entre 2012 e 2060, o índice de envelhecimento poderá aumentar de 131 para 307 idosos por cada 100 jovens. As consequências em termos de sustentabilidade económica e social do país e do bem-estar dos cidadãos são fáceis de antecipar. Com a falência pré-anunciada do sistema de segurança social, quem esperar viver apenas da sua pensão durante a reforma terá quase de certeza que enfrentar uma situação de pobreza. Podemos ter enormes benefícios por vivermos mais tempo. Mas são também enormes os desafios que se colocam aos sistemas de segurança social, ao setor financeiro, e à sociedade e economia em geral. Terão que se tomar decisões mais cedo ou mais tarde. Na discussão política sobre as medidas a tomar, à esquerda ou à direita, a procrastinação reina quando se trata de tomar decisões que garantam um futuro sustentável. Mas o certo é que o tempo será sempre senhor da razão. Referências: Luís Catela Nunes (A coluna Notas da Nova é uma contribuição para a reflexão na área da saúde, pelos membros do centro de investigação Nova Healthcare Initiative – Research. São artigos de opinião da inteira responsabilidade dos autores) |