
Dados do Relatório Anual da Gestão da Disponibilidade de Medicamentos relativos a 2024, hoje divulgados, indicam que 1.545 as farmácias notificaram faltas de medicamentos, uma situação que acontece quando não é possível satisfazer a prescrição médica num período inferior a 12 horas.
Na verdade, a questão das ruturas não é um problema exclusivamente português. Em declarações aos jornalistas, o diretor da Unidade de Projetos Interinstituicionais e para o Sistema de Saúde do Infarmed, Nuno Simões, sublinhou que acontecem em toda a Europa, e sublinhou que há a nível europeu grupos de trabalho que visam analisar o problema e que tudo está a ser discutido a nível europeu para harmonizar “medidas para garantir maior disponibilidade de medicamentos a nível nacional, de cada país, e salvaguardar melhor os direitos dos doentes”.
Maior número de notificações
Em 2024, os medicamentos agonistas dos recetores do GLP-1 (dulaglutido e semaglutido) bem como os medicamentos contendo sucralfato, subcitrato de bismuto potássico + metronidazol + tetraciclina, estriol, proteínosuccinilato de ferro e metilfenidato foram os que registaram maior número de notificações de faltas por parte das farmácias, dos utentes e profissionais de saúde. Alguns destes medicamentos tiveram também períodos de rutura notificada.
Dos medicamentos com ruturas notificadas, segundo a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), apenas 14 (menos três do que em 2023) não tinham substituto no mercado, mas ainda assim o regulador aplicou medidas de mitigação que impediram o efeito no doente.
Ruturas com impacto elevado
No total, o documento diz que das 12.436 apresentações comercializadas, 80% (9.899) nunca esteve em rutura, 17% (2.141) esteve, mas sem qualquer impacto no doente, 3% (377) teve um impacto médio e em 19 (0,2%) o impacto da rutura foi elevado, pois não há substituto no mercado, mas o Infarmed encontrou soluções de mitigação.
Entre os medicamentos cuja rutura teve um impacto considerado elevado estão:
- Anti-infeciosos: Ganciclovi
- Sistema Nervoso Central: Metadona e Primidona
- Aparelho cardiovascular: Colestiramina
- Hormonas e medicamentos usados no tratamento das doenças endócrinas: Glucagom
- Medicação antialérgica: Clemastina
- Medicamentos antineoplásicos e imunomoduladores: Bleomicina, Cisplatina, Fluorouracilo, Tamoxifeno, Imunoglobulina antilinfócitos (coelho), Tasonermina.
- Meios de diagnóstico: Tuberculina e Tecnécio (99mTc) pertecnetato.
Para impedir o impacto no utente, o Infarmed aplicou diversas medidas, entre elas a Autorização de Utilização Excecional (AUE) – ao hospital ou ao distribuidor -, a monitorização das necessidades dos utentes para se fazer uma distribuição limitada.
O relatório refere ainda que no ano passado a Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica emitiu 58 pareceres sobre alternativas terapêuticas, uma opção para quando falta um medicamento.
Empresas com maior número de ruturas
Em 2024, 72% das ruturas (3.160 ruturas notificadas) foram efetivas, enquanto 28% não chegaram a ocorrer porque o risco foi mitigado com as diversas medidas adotadas.
Entre as empresas com maior número de ruturas, o relatório indica: Generis Farmacêutica, S.A (com 520); KRKA d.d., Novo mesto (com 155) e Ratiopharm – Comércio e Indústria de Produtos Farmacêuticos, Lda ( com 155); e KRKA Farmacêutica, Sociedade Unipessoal, Lda (com 148).
Sempre que o titular de Autorização de Introdução no Mercado (AIM) prevê uma interrupção do abastecimento deve notificá-la ao Infarmed, com dois meses de antecedência. Contudo, em mais de metade dos casos esse prazo não foi cumprido.
Aliás, o relatório diz mesmo que se tem verificado “um aumento do incumprimento dos dois meses da notificação antecipada por parte dos titulares de AIM”.
Por que razão há ruturas?
Quanto aos motivos das ruturas, na maior parte dos casos (57,44%) foram atrasos no fabrico ou incumprimento das condições contratualizadas, em 21,17% dos casos deveram-se ao aumento da procura (prescrição ou aquisição) e em 6,01% foi por problemas logísticos como atrasos na entrega devido ao transporte, armazenamento ou distribuição.
Escassez prolongada
Quanto ao tempo de duração das ruturas, metade apresentou uma duração inferior a dois meses, 23% uma duração entre dois e quatro meses, 11% entre quatro e seis meses e apenas 16% com uma duração superior a seis meses.
Relativamente à situação de escassez de medicamentos prolongada no tempo, o Infarmed tem monitorização os casos de alguns antidiabéticos, medicamentos para a hiperatividade e défice de atenção, para tratamento da insuficiência pancreática, para a erradicação da bactéria Helicobacter pylori, tratar ulceras gástricas e para a hipertensão.
Quanto aos antidiabéticos, sobretudo o semaglutido (nas três dosagens), dulaglutido e liraglutido, que têm escasseado no mercado pois a procura aumentou desde que começaram a ser também usados para perder peso, o Infarmed diz que a escassez se deverá manter durante o ano de 2025.