Manuel Pizarro critica proposta “perversa” que limita acesso de estrangeiros ao SNS 109

O ex-ministro da Saúde Manuel Pizarro alertou hoje que a proposta para limitar o acesso de estrangeiros não-residentes ao SNS é “perversa” e não impedirá o acesso de mulheres “que aterram” nas urgências no final da gravidez.

Defendeu também na comissão parlamentar de Saúde, onde, segundo a Lusa, foi ouvido, que o problema de “o turismo de saúde abusivo” tem que “ser resolvido no sistema de segurança interna e de informações e não no sistema de saúde”.

“Tentar deslocar isto para o sistema de saúde, além de ser errado do ponto de vista humanitário, veremos rapidamente que vai ser completamente ineficaz e até pode agravar as circunstâncias”, disse o antigo governante em resposta a questões levantadas por deputados na comissão de saúde, onde foi ouvido a pedido do Chega sobre a taxa de mortalidade fetal e infantil.

Questionado pela deputada do BE Marisa Matias sobre a proposta do Chega, votada favoravelmente pelo PSD e CDS-PP, que pretende alterar a Lei de Bases da Saúde para limitar o acesso ao SNS a estrangeiros não-residentes, só lhes permitindo aceder aos cuidados de saúde públicos em casos de emergência ou mediante pagamento, Manuel Pizarro disse temer que “seja mesmo perversa”.

Essa proposta não impedirá o acesso das pessoas que aterram com 37 ou 38 semanas de gravidez de recorrerem ao serviço, de acordo com uma definição humanitária, com a qual todos estamos de acordo que é um tratamento de urgência”, salientou.

Elucidou ainda: “A senhora chega em vésperas de trabalho de parto e vai ser naturalmente atendida. Portanto, não resolve o problema que é complexo. E, ao mesmo tempo, pode fazer com que, em certas circunstâncias, pessoas imigrantes que já resistem em Portugal tenham receio, ou sejam impedidas, de recorrer ao sistema de saúde”.

Na audição, Manuel Pizarro também falou sobre o fecho de maternidades observando que há mais encerradas do que “alguma vez estiveram em 2023”.

No seu entender, é “um erro absoluto a ideia de que cada hospital ou cada ULS (Unidade Local de Saúde)” possa gerir o horário de funcionamento da sua maternidade, porque isso conduziu a problemas que nunca tinham acontecido em 2023.

“Nunca tinha acontecido, enquanto fui ministro, estarem encerradas ao mesmo tempo as três maternidades da Península de Setúbal (…) e as três maternidades do Oeste”, vincou.

No início da audição, o deputado Rui Cristina, do Chega, questionou Manuel Pizarro sobre os “dados preocupantes” da mortalidade fetal e infantil em 2023, que coincidiu com o período em que tutelou a pasta da Saúde.

Embora Portugal esteja abaixo da média da União Europeia, a mortalidade fetal e infantil aumentou 36% de 2022 para 2023”, disse Rui Cristina.

Segundo diversos especialistas, estes números podem resultar de múltiplos fatores, como a falta de acesso a cuidados pré-natais, agravada pela incapacidade dos serviços, gravidezes não acompanhadas, associadas ao aumento da população estrangeira e ao turismo de saúde.

Comentando estas afirmações, Manuel Pizarro afirmou que há vários fatores que jogam a “desfavor do sistema” como o aumento da percentagem de partos a partir dos 40 anos.

Apontou também a “percentagem muito significativa de partos de mulheres que não são de nacionalidade portuguesa”, o que disse não ter “nenhum problema se as mulheres estiverem a viver em Portugal e forem seguidas no sistema de saúde.

“Mas será um problema se as mulheres aterram para ter o parto, como aconteceu, aliás, com o caso que na altura teve um grande impacto público e foi o motivo mais imediato da demissão da minha antecessora [Marta Temido]”, disse, aludindo à morte de uma grávida em agosto de 2022.

Quantos aos dados, o agora deputado do PS realçou que “Portugal é um dos países do mundo com melhores resultados em matéria de saúde materna e infantil”, mas alertou que os problemas que surgem não podem fazer aumentar essa realidade.

Destacou que “os cinco melhores anos da história” em mortalidade infantil em Portugal são 2020 e 2021, com 2,4 óbitos por mil nados-vivos, 2023 e 2010 (2,5,) e 2022 (2.6), “o que aparentemente indica” que Portugal não tem nenhum problema estrutural de gravidade no sistema de saúde materna e infantil.

Defendeu, contudo, que é preciso estar atento aos dados que aparecem, prevendo que a mortalidade infantil aumente significativamente em 2024 em relação a 2023, segundo dados preliminares publicados em dezembro.