Médicos do litoral alentejano alertam para falta de formadores de licenciados
27-Maio-2014
Responsáveis dos serviços de saúde do litoral alentejano alertam para o problema, «tipo bomba-relógio», de os médicos com capacidade para formar os jovens que saem das faculdades de Medicina estarem a caminho da aposentação.
«Estamos numa fase em que os médicos que se formaram nos anos 70, depois do 25 de Abril, uma leva muito grande, estão agora a chegar à fase de aposentação», disse hoje à agência “Lusa” o diretor da Unidade de Cuidados Intensivos do hospital integrado na Unidade local de Saúde do Litoral Alentejano (ULSLA), Pedro Moreira.
Este facto, aliado ao congelamento da progressão nas carreiras dos últimos anos, pode levar a que os serviços de saúde fiquem sem médicos especialistas para formar os novos licenciados em Medicina, frisou o clínico, que é também responsável pelo internato médico hospitalar na ULSLA.
O problema, «tipo bomba-relógio», referiu Pedro Moreira, vai acentuar-se face ao aumento do número de recém-licenciados em Medicina, provocado pelo recente aumento de vagas nas universidades, determinado para responder à generalizada falta de médicos.
A medida poderia ser positiva para a ULSLA, pois, com o «excedente» de recém-licenciados, abriu-se as portas para que a sua formação seja feita em «hospitais periféricos», como é o caso do Hospital do Litoral Alentejano, sustentou o responsável.
Contudo, a capacidade formativa daquela unidade é reduzida, devido à falta de médicos especialistas, e a limitação tende a agravar-se.
Em média, passam, pela ULSLA, 10 internos por ano, o que «é pouco em relação a outros hospitais», mas «adequado» à capacidade dos serviços, explicou à “Lusa” o responsável pelo internato médico de cuidados de saúde primários e de Saúde Pública, Mário Jorge.
Segundo o clínico, bastaria que a unidade tivesse dois pediatras, em vez de apenas um, para poder receber mais internos.
Atualmente, a ULSLA, que abrange os concelhos de Alcácer do Sal, Grândola, Odemira, Santiago do Cacém e Sines, pode dar formação apenas nas especialidades de Medicina Geral e Familiar, Saúde Pública, Medicina Interna, Cirurgia Geral e Ortopedia.
Para estes serviços, é importante formarem os jovens licenciados, pois representam a «única esperança» para irem preenchendo as lacunas de médicos especialistas no quadro de pessoal, afirmou Pedro Moreira.
«Os internos que terminam a especialidade, se quiserem, têm um contrato individual de trabalho feito aqui no hospital», indicou.
Já nas especialidades em que a instituição não tem «idoneidade» para formar, a resolução do problema é mais difícil, explicou o responsável, pela «retração» na contratação de novos funcionários públicos e porque os concursos para deslocação de médicos que já estão integrados no Serviço Nacional de Saúde «têm ficado desertos por falta de candidatos».
«Muitas vezes, esses profissionais, mesmo que queiram vir para cá, quando fazem as continhas, verificam que não compensa, porque iriam, de facto, perder dinheiro. Não há incentivos claros para estabilizar médicos nas zonas onde são realmente carenciados», criticou Mário Jorge.
Médicos formados no litoral alentejano são «única esperança» para suprir faltas
Paula, Sara e Marco escolheram o litoral alentejano para realizarem o ano comum do internato de Medicina, manifestando vontade de se fixar na região, e, para os serviços, são a «única esperança» para captar novos médicos.
Paula Gomes partiu de Lisboa para a cidade de Brno, na República Checa, onde tirou o curso de Medicina, tendo-se licenciado no ano passado.
Na altura de escolher o local para realizar o ano comum do internato médico, a jovem, de 25 anos, preferiu «a periferia» e o facto de ter uma segunda habitação na costa alentejana foi «crucial», por não ter de «gastar em residência».
Marco Alves, o companheiro, de 28 anos, que também se licenciou na Faculdade de Medicina de Brno, onde se conheceram, acompanhou-a na escolha.
Juntos decidiram não optar por um hospital central, pois ansiavam por uma maior «aproximação» aos tutores.
Nesse aspeto, as suas expectativas não estão a ser goradas, embora Paula Gomes confesse que, a nível prático, a experiência é limitada, porque «há menos procura de doentes», dado ser «uma zona pouco habitada».
No final do ano, ambos terão de escolher a especialidade e o local onde pretendem fazer o respetivo internato.
O casal manifestou à agência “Lusa” o desejo de permanecer na zona, pela «qualidade de vida» que permite, mas a decisão não depende diretamente de ambos.
Tanto Paula como Marco deverão enveredar pela Medicina Interna, uma das especialidades do Hospital do Litoral Alentejano (HLA) com o quadro de médicos «mais depauperado», de acordo com o diretor da Unidade de Cuidados Intensivos, Pedro Moreira.
Segundo o clínico, que é também responsável pelo internato médico hospitalar, faltam 10 especialistas de Medicina Interna para «completar o quadro» e a «única esperança» são os clínicos que se vão formando na Unidade local de Saúde do Litoral Alentejano (ULSLA).
A administração da ULSLA indicou à “Lusa” que, atualmente, «faltam 87 médicos de diversas especialidades clínicas», sendo os «serviços mais afetados» as urgências e a Medicina Geral e Familiar (MGF).
Em média, nos concelhos de Alcácer do Sal, Grândola, Odemira, Santiago do Cacém e Sines, 25% dos cerca de 100 mil habitantes não têm médico assistente nos centros de saúde, proporção que aumentaria para perto de metade se não fosse «o apoio» de 13 clínicos cubanos.
«A tendência é para a situação se agravar, dado que temos médicos de Medicina Geral e Familiar a reformarem-se e os novos concursos têm ficado com as vagas por ocupar», informou a administração da ULSLA.
Sara Borges da Costa representa, por isso, outra das «esperanças» da ULSLA, uma vez que, concluído o ano comum, pretende seguir a especialidade de MGF e, se possível, fixar-se na região.
A jovem, de 26 anos, é natural de Vila Nova de Santo André, no concelho de Santiago do Cacém, onde se situa o HLA e a sede da ULSLA, tendo sido esse um dos motivos principais da sua escolha.
«Tenho aqui uma qualidade de vida brutal e acho que ficar é uma mais-valia, porque se trata de uma população carenciada», referiu à “Lusa”.
A ULSLA pode dar formação apenas nas especialidades de MGF, Saúde Pública, Medicina Interna, Cirurgia Geral e Ortopedia, o que também se deve à falta de clínicos especialistas seniores, explicou Mário Jorge, responsável pelo internato médico de cuidados de saúde primários e de Saúde Pública.
No entanto, os médicos que concluem aqui a sua formação têm tendência para ficar, assegurou.
«Os internos que terminam a especialidade, se quiserem, têm um contrato individual de trabalho feito aqui no hospital», acrescentou Pedro Moreira.
Uma forma de ir superando, a «conta-gotas», o aparente desinteresse dos médicos já integrados no Serviço Nacional de Saúde pela região, o que os responsáveis explicam com a «falta de incentivos financeiros» por parte do Ministério da Saúde.