Médicos querem relação com doente classificada como Património da Humanidade 269

Médicos querem relação com doente classificada como Património da Humanidade

03 de Junho de 2016

Médicos de vários países querem que a relação entre o clínico e o paciente seja classificada como Património Imaterial da Humanidade, anunciou ontem, em Coimbra, o presidente do conselho geral da organização profissional dos médicos de Espanha.

«Estamos a preparar um projeto de candidatura à classificação, pela UNESCO [Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura], da relação médico/doente como bem imaterial da Humanidade», disse Juan José Rodríguez Sendín durante uma conferência internacional de médicos.

Sendín é presidente do conselho geral dos Colégios Oficiais dos Médicos espanhóis – Organización Medica Colegial de España (OMC) – entidade que equivale, de algum modo, à Ordem dos Médicos (OM) portuguesa e que reúne 52 associações profissionais daquele país.

A relação do médico com o doente é «fundamental para os resultados em saúde», é «fundamental para o doente, que precisa de ter em quem possa confiar e depositar as suas angústias, os seus medos e as suas ansiedades» e é «fundamental para o médico, que tem de ter a confiança do paciente» para melhor diagnosticar e tratar, sublinhou Rodríguez Sendín, em declarações à agência “Lusa”, à margem do Fórum Ibero-americano de Entidades Médicas, que teve início hoje, num hotel de Coimbra, e que termina no sábado.

Muitas doenças «não se tratam só com medicamentos» e estes podem, frequentemente, ser dispensados e «com melhores resultados para o doente» se houver aquela relação, sublinha o médico espanhol.

Mas, adverte, a relação/médico está a «baixar a humanização» porque é cada vez menos o tempo disponível para as consultas, correndo mesmo «o perigo de se perder, com consequências terríveis» para os sistemas de saúde, salientou o dirigente da OMC.

«O tempo é a base da relação médico/doente», defendeu, em declarações à agência “Lusa”, também à margem do fórum, o bastonário da OM, José Manuel Silva, que apoia também a candidatura daquela relação a Património Mundial.

Sem tempo para «ouvir o doente e para lhe explicar as razões das decisões» dos clínicos, «não é possível construir uma relação saudável» entre o médico e o doente.

«Perde-se a essência da medicina, que é o estabelecimento dessa relação de confiança», salienta o bastonário.

«Sofremos da doença dos indicadores, em que se avalia a produtividade da medicina pela quantidade dos atos produzidos e não pela qualidade dos resultados desses atos», afirma José Manuel Silva, sublinhando que é preciso «dar tempo para que o médico recupere a boa medicina».

A falta de tempo para as consultas médicas resulta de fatores «questões economicistas (e não económicas)», que «redundam em prejuízo», sustenta o bastonário da OM, recordando que o relatório da Fundação Gulkenkian sobre o SNS alertando para o facto de a perda de qualidade do ato médico ser «não só má para o doente, mas também para a economia».

O projeto de candidatura da relação/médico doente a Património Imaterial, que conta com o apoio de médicos e organizações destes profissionais de alguns países, será apreciado pela assembleia geral da Confederação Médica Latino-Americana e do Caribe [ou Caraíbas] (CONFEMEL), que decorrerá, em final de novembro, em Brasília, Brasil, adiantou Rodríguez Sendín.

A CONFEMEL é uma entidade não-governamental que reúne instituições médicas do Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela, Costa Rica, Guatemala, Haiti, Honduras, El Salvador, República Dominicana, Nicarágua, Panamá, Porto Rico, Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai e, desde 2015, de Portugal e Espanha.