Depois de a DECO ter revelado, esta quinta-feira, um estudo que afirma que o preço de um conjunto de 26 medicamentos de venda livre é mais elevado nas farmácias do que nas parafarmácias e hipermercados, numa diferença que pode chegar a mais de 14%, Ema Paulino, presidente da Associação Nacional das Farmácias, comentou o assunto em declarações ao Netfarma. E, desde logo, ressalva que a “metodologia aplicada no estudo” não é conhecida, bem com “a dimensão e a dispersão da amostra, que poderá ter um impacto significativo na interpretação dos resultados”.
O estudo da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor analisou o preço de um cabaz de 26 medicamentos não sujeitos a receita médica em farmácias, espaços de saúde das grandes superfícies e parafarmácias em todo o país, tendo concluído que “nas farmácias, a amostra de medicamentos selecionada é mais cara – a diferença chega a ser de mais 14% que nos outros canais de distribuição”.
A DECO acrescenta ainda que desde que os medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM) deixaram de ser vendidos exclusivamente nas farmácias, o preço deixou de ser fixado pelo Estado, e “a diferença de preços entre as grandes superfícies e as farmácias tem sido constante”, dando exemplos com alguns dos medicamentos mais vendidos em Portugal, nomeadamente Ben-u-ron, Daflon ou Voltaren, que estão entre os 26 fármacos que compõem a amostra do estudo.
Sobre o estudo, Ema Paulino é perentória: “Os pressupostos deste estudo estão errados. A DECO compara realidades que não podem, de modo algum, ser comparáveis, deixando de fora todo o serviço de intervenção em saúde associado a uma dispensa feita na farmácia, o qual não se encontra assegurado noutros locais de venda. Significa isto que, caso a comparação feita incluísse as circunstâncias e o contexto em que os medicamentos são disponibilizados, assim como os resultados em saúde obtidos, a conclusão seria outra, muito diferente”.
Recorda a responsável da ANF que “as equipas das farmácias incluem, em média, quatro farmacêuticos, profissionais de saúde altamente qualificados e diferenciados, que trabalham em permanência no aconselhamento e acompanhamento da população, apoiando as pessoas na utilização efetiva e segura do medicamento, e proporcionando, ao mesmo tempo, outro tipo de serviços de saúde associados”.
Frisa ainda que “nas parafarmácias não existe a obrigatoriedade de haver um farmacêutico” e que a “estrutura de custos de um e outro local é ela própria incomparável, tão incomparável quanto o é o nível de serviço de saúde prestado ou o acesso disponibilizado à população em todo o território do país, de forma capilar”.
“Escolhas mais económicas”? Não, o que for “mais seguro”
A coordenadora da área da saúde da DECO, Susana Santos, alerta que “o consumidor deve estar atento para fazer as escolhas mais económicas”.
“O inquérito comparou os preços deste ano com os de 13 produtos analisados em 2018 e, em média, todos os medicamentos estão mais caros. Por exemplo, o Trifene 200, 20 comprimidos, que está 89% mais caro em 2023 por comparação com 2018. No atual momento de estrangulamento financeiro, estas variações de preço podem ser decisivas para que um consumidor possa ou não comprar medicação”, salientou Susana Santos à Lusa.
Ema Paulino diz que as pessoas deverão estar, antes de mais, “atentas àquilo que é mais seguro e eficiente para a sua saúde, que lhes dá garantias de que estão a aceder, realmente, a um medicamento que lhes faz falta e lhes vai fazer bem”. A líder da ANF relembra que quando se fala “de MNSRM nas parafarmácias, falamos unicamente de acesso a um produto”, mas que na farmácia se trata de muito mais: “Já nas farmácias, falamos de acesso a uma avaliação sobre a necessidade, ou não, da toma de um medicamento; a necessidade, ou não, do reencaminhamento para um médico; a necessidade daquele medicamento em concreto ou de outro mais seguro, mais eficaz ou simplesmente efetivo na condição que a pessoa apresenta”.
“São frequentes os casos de pessoas que nos pedem apoio porque já tomaram determinado medicamento que não foi efetivo, porque simplesmente não era o adequado à sua circunstância. A existência de uma intervenção profissional para avaliar se aquele medicamento é necessário, se é adequado e se é seguro, garante que não se atrasam diagnósticos, que a pessoa não coloca a sua saúde em risco, nem terá, depois, de gastar dinheiro adicional”, garante.
E finaliza ao dizer que a ANF defende uma “reavaliação à terceira lista de medicamentos” porque acredita que há medicamentos não sujeitos a receita médica que “deveriam ser de dispensa exclusiva em farmácia, e não apenas por questões de segurança, mas também de eficiência”. “Um exemplo disto é a pílula do dia seguinte. As pessoas estarão a utilizar com maior frequência um medicamento de que não necessitariam caso adotassem outro tipo de medidas mais adequadas, e eficazes, de contraceção. Nos locais de venda de MNSRM, ao contrário de nas farmácias, não há profissionais de saúde para fazer uma avaliação e recomendação nestes casos, e perdem-se assim oportunidades de intervenção em saúde pública, com todos os custos a isso associados”, conclui.
DECO: “Consumidor poupa se comprar nos espaços de saúde dos hiper ou supermercados”
O estudo da DECO revela ainda que o Ben-u-ron (500 mg) custava 2,52 euros em média num hipermercado e 2,79 euros, em média, em farmácias; o Daflon (1000 mg) custava 18,84 euros em média num hipermercado e 21,36 euros em média em farmácia e o Voltaren Emulgelex Gel, embalagem de 180g, custava 21,35 euros em média nas parafarmácias e mais dois euros, em média, na farmácia.
“Não temos dados para concluir qual o motivo dos MNSRM serem mais caros nas Farmácias”
Segundo dados da Autoridade Nacional de Medicamentos e Produtos de Saúde (Infarmed), as farmácias continuam a deter o maior volume de vendas (78% do mercado).
“No entanto, na esmagadora maioria dos casos, o consumidor poupa se optar por comprar nos espaços de saúde dos hipermercados ou supermercados – aqui, os 26 medicamentos analisados custam no total cerca de 218 euros, em contraponto com as parafarmácias de rua (232 euros), e com as farmácias e farmácias online (245 euros e 252 euros, respetivamente)”, salienta a DECO.
Analisando as diferenças de distrito para distrito, a organização refere que o mesmo fármaco pode sofrer “uma variação de preço considerável”, sendo que Castelo Branco, Guarda e Santarém são os distritos onde, em média, os preços dos medicamentos de venda livre são mais baratos, enquanto Beja é onde os consumidores pagam mais.
Em Castelo Branco e Guarda, o cabaz custa em média 210 euros, e em Beja, a média atinge os 252 euros. Traçando a média para Portugal Continental, o estudo indica que estes 26 medicamentos custariam 237 euros.
“Na verdade, a diferença de preços entre as grandes superfícies e as farmácias tem sido constante ao longo dos anos. Foi exatamente o que aconteceu entre 2018 e 2023: a percentagem situa-se nos 14%, entre os preços praticados nas farmácias e os que as parafarmácias nas grandes superfícies apresentam. No entanto, existem exceções à regra e nem todas as parafarmácias responderam ao inquérito que serve de base ao teste”, ressalva a associação.