O futuro começa agora: a avaliação de tecnologias da saúde em Portugal e o SiNATS 1267

A procura de eficiência no sector dos cuidados de saúde requer que seja dada prioridade aos tratamentos que fornecem o maior benefício pelo dinheiro gasto.

Se toda a inovação gerada fosse poupadora de recursos, desde que a mesma cumprisse os requisitos de qualidade, segurança e eficácia, seria sempre adoptada com o aval dos decisores. Contudo, só uma pequena parte dos tratamentos ou dispositivos médicos “novos” apresenta custos inferiores ao que se propõe substituir. Assim, devendo ser uma obrigação ética dos decisores maximizar a saúde da população de acordo com o orçamento disponível, é compreensível que peçam a demonstração das vantagens que podem advir da adopção da inovação quando a mesma é paga com o dinheiro dos contribuintes.

O padrão de evidência necessário para convencer os decisores políticos é cada vez mais elevado. Tal compreende-se quando se constata que quanto maior é o progresso maior é o custo para obter melhorias adicionais, o que é justificado pela lei dos rendimentos marginais decrescentes. Assim, percebe-se que hoje em dia não seja discutível o impacto da avaliação económica de tecnologias de saúde no processo de tomada de decisão dos cuidados em saúde e da política de saúde.

Por um lado, existe tanta informação disponível que a sua quantidade pode tornar-se ingerível e é preciso identificar a que é relevante para o processo de tomada de decisão. Por outro lado, a avaliação económica permite resolver os conflitos da profissão médica tornando explícitas para o médico as restrições existentes sobre os recursos disponíveis. A avaliação económica acaba por significar a tradução da evidência para a prática e uma mudança na tomada de decisão do prestador para o pagador de cuidados, devendo ser encarada como uma ponte entre ambos.

A avaliação económica é uma metodologia de análise que pressupõe a identificação, medição, valorização e comparação de alternativas de tratamento em termos dos seus custos e consequências (1). É um instrumento fundamental para nos dar uma ideia mais aproximada da verdadeira “vantagem económica” num contexto de recursos escassos e procura crescente.

Em 1999, Portugal foi o primeiro país europeu a desenvolver e publicar oficialmente orientações metodológicas para a realização de estudos de avaliação económica de medicamentos (2). Estas orientações passaram a guiar os pedidos de reembolso dos medicamentos sujeitos a receita médica em ambulatório. Em 2006 (3), a necessidade de apresentação de estudos de avaliação económica passou a ser aplicável também aos medicamentos de utilização exclusiva hospitalar e de outros medicamentos sujeitos a receita médica restrita e comercializados apenas em âmbito hospitalar.

Contudo, ao longo de 2014, o INFARMED tem apresentado o SiNATS – Sistema Nacional de Avaliação de Tecnologias de Saúde. Pretende-se com este Sistema reformar e melhorar o processo de avaliação de medicamentos que já temos implementado e criar as bases para uma participação mais enquadrada no modelo europeu em desenvolvimento.

Quais serão as alterações mais significativas?
A primeira está relacionada com o alargamento da avaliação aos dispositivos médicos. A segunda prevê que a avaliação, além de incluir a apreciação da efectividade relativa (valor terapêutico acrescentado) e custo-efectividade (valor económico), passará também a poder contemplar outras dimensões do valor da tecnologia, criando espaço para uma análise diferenciada nas questões dos medicamentos órfãos. Em termos de decisões passa a ser considerado explicitamente o mecanismo de partilha de risco entre fabricante e o pagador bem como a criação de processos de monitorização adicional da utilização.

Finalmente, está também prevista uma reavaliação das tecnologias já aprovadas, passando a ser possível ter avaliações ex-post e rever decisões de aprovação anteriores.

Este Sistema é ambicioso e exigente. Contudo, dá respostas a algumas das críticas apontadas ao modelo em vigor e é uma mudança na direcção certa.
O futuro já começou!

(1) Drummond, M.; Sculpher, M.; Torrance, G.; O’Brien, B.; Stoddart, G. – Methods for the Economic Evaluation of Health Care Programmes. Oxford: Oxford University Press, 2005.
(2) Despacho do Ministério da Saúde n.º 19064/99, de 9 de Setembro
(3) Decreto-Lei n.º 195/2006, de 3 de Outubro

Céu Mateus

(A coluna Notas da Nova é uma contribuição para a reflexão na área da saúde, pelos membros do centro de investigação Nova Healthcare Initiative – Research. São artigos de opinião da inteira responsabilidade dos autores.)