OM: Indústria Farmacêutica pratica valores «obscenos e criminosos» 12 de Novembro de 2015 O bastonário da Ordem dos Médicos (OM) avisou ontem que Portugal e Espanha estão a sofrer com uma «escalada imoral dos preços» definidos pela Indústria Farmacêutica, que pratica valores «obscenos e criminosos». «É preciso mudar o conceito de que estamos a consumir recursos a mais, não é isso que está em causa. O que estamos a sofrer é com uma escalada imoral dos preços definidos pela indústria da saúde, quer a nível de medicamentos como de dispositivos médicos. E isso exige regulação, que deve ser definida e legislada pelos governos», afirmou o bastonário José Manuel Silva em declarações à agência “Lusa”. A afirmação foi feita no final de um encontro em Lisboa com a Ordem dos Médicos portuguesa e a sua congénere espanhola, a Organizácion Médica Colegial de España (OMCE), para debater as preocupações dos dois países sobre a degradação dos serviços de saúde e a dificuldade dos pacientes no acesso a medicação inovadora. «Assistimos a uma escalada de preços dos bens da saúde que é incomportável», insistiu o bastonário, indicando que o principal problema tem sido a «disparidade» na avaliação do que é o valor acrescentado de salvar uma vida. «Faz com que a indústria esteja a estabelecer preços absolutamente obscenos, absolutamente criminosos, porque estão a impedir muitos doentes de ter acesso a terapêuticas de que necessitam», sublinhou. Enquanto medicamentos que salvam vida estão a ter um valor sobredimensionado, segundo o bastonário, «um médico que salve a vida a um bebé que vai ter uma esperança de vida de 85 anos recebe o valor correspondente a uma consulta». Esse sistema de definição de preços necessita de regulação, de legislação, de limites, consideram as ordens representativas dos médicos portugueses e espanhóis. Na Declaração de Lisboa, que selou o encontro das duas ordens, é tido como «imprescindível que o preço dos medicamentos utilizados nos tratamentos tenham em conta os orçamentos nacionais de saúde e que se alcance o necessário equilíbrio entre o acesso a medicamentos inovadores e a sustentabilidade dos sistemas nacionais de saúde». O documento defende ainda que os países devem exigir à Comissão Europeia que estude modelos alternativos aos baseados no monopólio das patentes quando se trata de medicamentos ou vacinas produzidos por associações público-privadas. José Manuel Silva lembrou, em declarações à “Lusa”, que a Indústria Farmacêutica aproveita «muitas vezes o investimento público na investigação»: «sejam as bolsas ou os projetos com financiamento público, que geram a descoberta de novos produtos e que dão origem a patentes exploradas pelo setor privado, com incrementos de margem de lucro de milhares por cento nalguns casos». «Não estamos à espera que a Indústria seja uma Misericórdia», admitiu o bastonário, lembrando o caso do fármaco inovador para tratamento da hepatite C, que colocou vários governos europeus a tentarem renegociação de preços. Uma das soluções pode passar pela criação de um fundo à escala global para os medicamentos inovadores, com uma gestão e contribuição que abarcasse os vários países. «A forma como poderia evoluir teria de ser ainda pensada», reconheceu o economista Pedro Pita Barros, que ontem deixou a ideia no encontro entre a Ordem dos Médicos e a sua congénere espanhola. «Se a ideia for pagar a inovação à indústria farmacêutica de uma vez, como uma remuneração imediata, é preciso ter o dinheiro para pagar esse prémio. É preciso ter fundos que venham das contribuições dos países», referiu. Contudo, a ideia de como o fundo seria exatamente gerido ainda teria de ser clarificada, podendo ser repartido o seu financiamento pelas vantagens que cada Estado tem com a inovação. Para a Ordem dos Médicos, o essencial é, em primeiro, mudar o conceito de que se está a consumir recursos a mais: «Se analisarmos os dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), estamos a gastar quer em Portugal quer em Espanha, em termos de despesa pública de saúde, muito menos do que a média dos países da OCDE. Os dois países tiveram um corte anual de despesa pública em saúde correspondente 1 % do PIB». |