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Ordem denuncia «exploração ignóbil» e ilegal dos médicos internos

 


18 de janeiro de 2018

O bastonário dos Médicos denuncia que há uma «exploração ignóbil» e «ilegal» dos médicos internos nalguns grandes hospitais e avisa que a situação pode ter implicações disciplinares.

Em entrevista à agência “Lusa”, quando faz um ano, na sexta-feira, da sua eleição como bastonário, Miguel Guimarães diz que há hospitais em que os médicos internos estão a fazer urgência sozinhos, uma situação «completamente ilegal».

«As administrações hospitalares não podem fazer isto. É grave, é muito grave. (…) Estamos a ter várias informações de alguns hospitais, nomeadamente dos grandes, de que existem equipas em que só os médicos internos é que estão responsáveis por uma equipa de urgência», afirmou.

O bastonário avisa que esta situação viola as regras do internato médico, viola o código deontológico e que «pode ter implicações disciplinares», além de não proteger os doentes.

A Ordem pode suspender o internato médico nas unidades em que isto aconteça e Miguel Guimarães afirma que vai atuar sobre estes casos: «Não podemos aceitar isto. Pode ter implicações disciplinares para quem tiver obrigado os médicos internos a fazê-lo. E aí não vou hesitar».

O bastonário afirma ter relatos de pelo menos três situações em grandes hospitais, como o São João e o Santa Maria, e adianta que vai verificar se há outras denúncias junto das secções regionais da Ordem dos Médicos, uma vez que nem todas as queixas chegam diretamente ao responsável máximo da Ordem.

Os médicos internos podem proteger-se destas situações, refere Miguel Guimarães, devendo recusar fazer tarefas mais diferenciadas quando não tenham a tutela de um médico especialista.

O bastonário afirma que os médicos internos são usados para «tapar buracos» dos serviços, de uma forma que «demonstra a grande insuficiência de capital humano no Serviço Nacional de Saúde (SNS)».

«Estão a ser excessivamente explorados», qualifica, adiantando que os hospitais têm neste momento muita dificuldade em encontrar médicos para fazer serviço de urgência.

Dos dados oficiais do Ministério da Saúde que analisou, Miguel Guimarães afirma que existiam mais médicos especialistas em 2011, 2012, 2013 e 2014 do que em 2015, 2016 e 2017.

Admite que o ministro Adalberto Campos Fernandes «aumentou ligeiramente o número de especialistas» em 2016 e 2017 quando se compara com 2015.

Contudo, lembra que 2015 foi um ano de uma «clara quebra» de profissionais, passando de cerca de 19 mil especialistas para menos de 17 mil. Em 2016 recuperou-se novamente para mais de 17 mil e este ano haverá cerca de 18.200 médicos especialistas, ainda assim não atingindo os mais de 19 mil que se verificavam entre 2010 e 2014.

Quanto à emigração, em cinco anos foram para outros países cerca de 1.200 profissionais, com a saída de clínicos a ter uma diminuição ligeira no último ano.

«Pode haver uma diminuição ligeira, mas se num ano temos 200 ou 300 médicos a emigrar, isso é preocupante. Continuamos a perder para fora do SNS alguns dos nossos melhores valores, pessoas em que o país apostou», declara Miguel Guimarães.

O «maior fenómeno» que estará a ocorrer atualmente é a saída de médicos do SNS para o privado.

«Ou o Governo quer revitalizar o SNS ou quer deixar cair o SNS. E eu começo a ter dúvidas sobre quais são exatamente as perceções do Governo», diz o bastonário, considerando que a prova da insuficiência de recursos humanos está no que o Estado paga a empresas por médicos tarefeiros.

Em 2016 o Estado gastou cerca de cem milhões de euros com empresas para prestar serviços médicos. Acresce ainda, segundo Miguel Guimarães, que quase um quarto do vencimento médico mensal diz respeito a pagamento de horas extraordinárias.

O bastonário mantém as contas que tinha estimado em junho, indicando que faltarão cerca de quatro mil médicos no Serviço Nacional de Saúde.