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Peritos defendem novo pacto para a saúde com mais poder para os cidadãos

23 de setembro de 2014

Uma comissão de peritos propõe um novo pacto que redirecione o sistema de saúde para a pessoa e não apenas o doente, tutelado por um organismo em que os cidadãos participem e com um «fundo» que financie a mudança.

As personalidades que compõem esta comissão, presidida por Nigel Crisp, que liderou o Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS), responderam com esta proposta ao desafio da Plataforma Gulbenkian para um Sistema de Saúde Sustentável de «construir uma nova visão do Sistema Nacional de Saúde (SNS)».

A comissão contou com o contributo de 35 especialistas portugueses de diferentes áreas até chegar ao relatório final.

O documento aponta no sentido de uma «mudança radical para melhorar a saúde e criar um sistema de saúde que seja sustentável no futuro” e propõe um novo pacto na saúde, em que todos terão um papel a desempenhar – os cidadãos, os profissionais da saúde, os professores, os empresários, as autarquias e o Governo».

«A saúde não pode ficar entregue exclusivamente aos profissionais do sector ou aos políticos, nem pode ser encarada simplesmente como uma área de negócio ou um serviço do Estado», justificam os autores do documento, citados pela “Lusa”.

Os peritos defendem «uma transição do sistema atual, centrado no hospital e na doença, em que todas as ações têm como objeto e alvo o doente, para um sistema centrado nas pessoas e baseado na saúde, em que os cidadãos são parceiros na promoção da saúde e na organização dos cuidados».

Para tutelar este «pacto para a saúde», a Comissão defende a criação de um Conselho Nacional de Saúde, «representativo dos cidadãos e de todos os sectores da sociedade» e que deverá ser «politicamente independente e responsável perante a Assembleia da República, o ministro da Saúde e a população em geral».

Outra recomendação passa pela criação de um novo organismo – o SNS Evidência –para «conjugar o programa existente de normas de orientação clínica com novos processos para avaliação das novas tecnologias e terapias, assegurando que o sistema faculta, de forma sempre atualizada e crítica, o melhor conhecimento científico disponível (as evidências científicas)».

Para «ajudar a suportar os custos de “redundância” e outros custos provisórios do desenvolvimento de um sistema de saúde, em que haja melhor gestão das doenças crónicas, mais serviços domiciliários nas comunidades locais e redes de especialidades cobrindo todas as regiões do país», a comissão defende a criação de «um fundo de transição».

A comissão deixa um repto aos cidadãos e à sociedade em geral: «Os cidadãos terão de estar na posse dos seus registos de saúde, de dispor de informações sobre a qualidade e os custos dos serviços e de participar nos processos de decisão».

Uma das áreas em que os especialistas elegeram vantagens nas contribuições dos cidadãos é nas doenças crónicas, exemplificando com a dimensão da diabetes em Portugal, onde a doença tem um especial impacto.

Para essa nova participação dos cidadãos na saúde, os especialistas recomendam uma série de medidas, como «um novo programa intersectorial do governo para a educação e literacia da saúde que prepare, em termos práticos, os cidadãos para se manterem saudáveis e para, quando doentes, participarem na tomada de decisões».

«Este programa deverá ter grande visibilidade e ser liderado por um grupo de embaixadores, incluindo personalidades dos meios de comunicação, em coordenação com os ministérios da Saúde e da Educação».

Os especialistas sugerem que seja «dada elevada prioridade à plena implementação de um registo de saúde eletrónico, como base essencial para um serviço integrado de alta qualidade e que faculte aos cidadãos, em formato eletrónico ou outro, toda a informação sobre a sua saúde» e «uma fonte única de informação acreditada acessível a todos os cidadãos, eventualmente integrada no Portal da Saúde».

«O Ministério da Saúde deverá nomear não-profissionais para representar a perspetiva dos cidadãos e dos doentes perante os órgãos de gestão das instituições de saúde».

Exagero na utilização de urgências e poucos cuidados de longa duração

A referida comissão de peritos em saúde concluiu que Portugal tem cuidados primários pouco desenvolvidos, uma utilização exagerada dos serviços hospitalares de emergência e trauma e menor capacidade em cuidados de longa duração.

Segundo o relatório “Um Futuro para a Saúde – todos temos um papel a desempenhar”, «o envelhecimento da população e o aumento das patologias crónicas de longa duração exigem que novos serviços sejam criados».

Os especialistas defendem «serviços domiciliários e de proximidade mais disponíveis, com a participação das instituições de solidariedade e voluntariado, para melhorar a oferta de cuidados de longa duração, de cuidados paliativos e de saúde mental, tirando vantagem dos avanços da medicina e da tecnologia para novas formas de monitorizar parâmetros de saúde, novas formas de diagnóstico e tratamento».

Outra recomendação vai no sentido da melhoria das «condições para a gestão das doenças crónicas, tendo como alvo 5,5 milhões de pessoas que padecem de uma ou mais patologias crónicas».

«Este objetivo deve incluir cerca de 4% da população que sofre de cinco ou mais doenças crónicas, reconhecendo que 5% dos doentes com períodos de internamento hospitalar mais longos usam cerca de 31% das camas».

«A criação de uma rede de referenciação de especialidades, por exemplo nas áreas do cancro e dos acidentes vasculares, para facilitar a articulação de cuidados em grandes centros e regiões, melhorando os seus níveis de prestação e libertando financiamento que pode ser investido em outros serviços» é ideia igualmente defendida pela comissão, presidida por Nigel Crisp, que liderou o SNS britânico (NHS).