A BRIDGES (Biotechnology Research, Innovation and Design for Health Products), a nova unidade de investigação do Instituto Politécnico da Guarda (IPG), vai transformar a lignina, um subproduto da pasta de papel, num recurso para a encapsulação de fármacos na indústria biomédica, nomeadamente agentes terapêuticos anticancerígenos, anti-inflamatórios ou ansiolíticos.
Para o projeto, denominado Bio-Ligne, a equipa do Politécnico conta com a colaboração da empresa Biotek S.A., de Vila Velha de Ródão (distrito de Castelo Branco), para otimizar a extração de lignina das águas residuais da indústria de pasta de papel e utilizá-la como matéria-prima para produzir nanomateriais inovadores para a administração de medicamentos.
“Com este projeto, pretendemos valorizar um subproduto da indústria do papel, que é normalmente descartado e incinerado, demonstrando a sua aplicabilidade no desenvolvimento de novos produtos biomédicos”, afirma o docente da Escola Superior de Saúde e coordenador do projeto Bio-Ligne, André Moreira, citado pela Lusa. A Biotek fornecerá amostras das quais será extraída a lignina, que vai ser utilizada para desenvolver novos sistemas de entrega (cápsulas) de agentes terapêuticos, acrescenta o docente.
O Bio-Ligne quer aproveitar a natureza hidrofóbica (não absorve nem retém água) da lignina para criar nanopartículas, num processo rápido, eficiente e escalável, utilizando a técnica denominada ‘flash nanoprecipitation’.
Inicialmente, será testado o potencial das nanopartículas à base de lignina para atuarem como sistemas de libertação de fármacos, através de simulação computacional.
Depois, será avaliada a interação entre a lignina e as moléculas terapêuticas, e estudada a eficiência de encapsulação e o perfil de libertação dos agentes terapêuticos (ou seja, vai ser avaliada a compatibilidade da lignina com outros agentes normalmente presentes nas cápsulas de medicamentos).
Posteriormente, vão ser analisados os nanomateriais contendo os agentes terapêuticos (anticancerígenos, anti-inflamatórios ou ansiolíticos), avaliando o seu potencial para serem aplicados no tratamento de várias enfermidades, tais como o cancro e doenças inflamatórias.
“O projeto vai abrir caminho a uma rede colaborativa e intersetorial entre as indústrias do papel e farmacêutica, impulsionando a transferência, do laboratório para a clínica, de soluções biotecnológicas baseadas na lignina”, defende André Moreira.
Com duração de 18 meses (de 01 de janeiro de 2025 a 30 de junho de 2026), o projeto será financiado com 50 mil euros, sendo a equipa composta por alunos, investigadores e docentes do IPG.
A lignina
Segundo o IPG, a nível mundial, são extraídas 50 a 70 milhões de toneladas de lignina por ano, prevendo-se um aumento para 225 milhões de toneladas anuais até 2030.
“Nos últimos anos, a lignina tem sido reconhecida como um polímero natural valioso: tem imenso potencial para o desenvolvimento de soluções biotecnológicas para a regeneração de tecidos e a administração de medicamentos, devido à sua abundante disponibilidade, biocompatibilidade, versatilidade estrutural e propriedades mecânicas”, segundo referido na nota do IPG a que a Lusa teve acesso.
No entanto, a extração e exploração da lignina não é considerada atualmente para fins biomédicos e apenas cerca de um milhão de toneladas de resíduos de lignina, em todo o mundo, são isolados e vendidos para aplicação industrial.