Os últimos anos têm sido marcados por um reforço significativo dos orçamentos para o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Paradoxalmente, multiplicam-se relatos de insufiências de recursos e problemas operacionais, que acentuam as dificuldades estruturais do SNS. Assim, apesar do reforço orçamental, a busca por uma maior eficiência na prestação de cuidados de saúde permanece um dos principais desafios.
Uma das linhas de produção dos hospitais do SNS prende-se com a realização de consultas externas. Em 2019, realizaram-se mais de 12 milhões de consultas de especialidade nos hospitais do SNS. Porém, a falta de comparência de utentes impede a realização de muitas das consultas previstas. Cria-se por isso um desvio, e uma capacidade não aproveitada, entre as consultas marcadas e as consultas efetivamente realizadas.
Estimativas oficiais sugerem pelo menos um milhão de consultas anuais não se realizam por ausência do utente. Por exemplo, no Centro Hospitalar de Lisboa Norte, mais de 135 mil consultas ficaram por realizar em 2018 – correspondendo a mais de 15% do total de consultas realizadas. Em 2018, as ausências por falta do doente foram cinquenta vezes superiores às consultas não realizadas devido a greves de profissionais de saúde.
Existem múltiplas razões que explicam a falta dos utentes às respetivas consultas. Por um lado, fatores externos como a meteorologia, a distância aos hospitais ou greves de transportes podem afetar a assiduidade dos utentes. Por outro lado, os elevados tempos de espera podem levar alguns utentes a procurarem tratamento noutras instituições, ou mesmo eliminar as causas que motivaram a marcação inicial. Contudo, uma fatia significativa das faltas dos utentes pode estar relacionada com o simples esquecimento – tendo em consideração o hiato significativo entre o momento da marcação e o da realização da consulta.
Existem diversos incentivos que podem ser implementados para tentar reduzir as faltas dos utentes. Em 2013 chegou a ser legislado que os utentes tivessem que efetuar o pagamento das consultas não realizadas. Porém, para além de incentivos negativos, existem também incentivos positivos – tal como o envio de notificações via telemóvel para relembrar o utente das respetivas consultas.
Uma análise preliminar1 de consultas marcadas entre 2014 e 2019 para três especialidades, sugere que este tipo de intervenção – normalmente com um custo reduzido – pode ter um impacto significativo na redução das faltas dos utentes. Nestes anos, para as especialidades de oftalmologia, ortopedia e otorrinolaringologia, foram marcadas mais de dois milhões de consultas. Para esta amostra, verificou-se que cerca de 13% dos utentes faltaram à respetiva consulta. Durante este período, alguns hospitais do SNS implementaram sistemas de alerta por SMS para relembrar os utentes das suas marcações. Nesses hospitais, nos meses seguintes à implementação deste tipo de sistema, a taxa de ausência em consultas foi reduzida em um terço (como se pode ver na figura abaixo, que representa a taxa de ausência por hospital em cada mês).
A utilização de algumas intervenções de baixo custo pode contribuir para reduzir as faltas por parte dos utentes às consultas marcadas. A redução dessas faltas traduz-se num aumento da capacidade real do sistema de saúde, sem que tal seja acompanhado de um aumento idêntico dos custos. Contudo, será importante perceber a importância relativa destes mecanismos em diferentes hospitais e especialidades, bem como se o seu impacto permanece ao longo do tempo.
- Investigação preliminar a ser desenvolvida por Joana Pestana e Eduardo Costa, investigadores na Nova School of Business and Economics.
Eduardo Costa
Nova School of Business and Economics
Professor e Investigador em Economia da Saúde