Descubra qual a ‘reação adversa’ que Paula Teixeira, candidata à presidência do Conselho do Colégio de Especialidade de Indústria de Farmacêutica (IF) da Ordem dos Farmacêuticos (OF), pela Lista I, eliminaria da profissão ou ainda qual o princípio ativo que melhor descreve a sua personalidade.
- Qual é o princípio ativo que melhor descreve sua personalidade?
Do ponto do vista farmacológico poderia ser a adrenalina – é o que dizem os meus colegas e está tudo dito. Do ponto de vista de características físico-químicas, uma substância química de cor branca, cristalina, de pureza elevada, com um bom perfil de estabilidade, com boas características tecnológicas. Do ponto de vista farmacodinâmico revela uma boa biodisponibilidade, é eficaz e apresenta uma boa margem de segurança.
- Se a sua vida fosse uma bula, qual seria a principal contraindicação?
Consideraria duas, que conjugadas podem ser explosivas: a frontalidade e espontaneidade. Se, por um lado, podem ser características que até conferem carisma e que são apreciadas num contexto social, mais informal, por outro lado, no contexto profissional, têm de ser bem doseadas para não excederem a dose recomendada.
- Qual é o maior efeito colateral de ser farmacêutico?
Focamo-nos demasiado nos “algarismos significativos” e perdermos a visão de helicóptero. Temos de saber balancear melhor a componente técnico-científica, o zelo pela qualidade, eficácia e segurança dos medicamentos, naturalmente, a par da compliance e ética, com a sustentabilidade do negócio e o risco associado.
- Qual foi a fórmula (ou decisão) mais inovadora que criou/tomou?
Foi uma decisão de mudança de atitude. As alterações de comportamento e atitude são das mais difíceis de mudar. Mas a maturidade e experiência permitem-nos assumir as mudanças com mais serenidade, mas também com mais firmeza e segurança. Vivemos num equilíbrio, por vezes difícil, entre a compliance e o negócio, e as decisões são cada vez mais tomadas com o foco centralizado no paciente e suportadas em análise do risco. Num ambiente profissional muito regulamentado mas também muito competitivo, saber gerir as expectativas dos diferentes ”stakeholders”, a capacidade de saber dizer não, no final do dia pode fazer a diferença.
- Se pudesse desenvolver um medicamento revolucionário, para que seria?
Salvar vidas, naturalmente, e minimizar o sofrimento nos mais vulneráveis, crianças e idosos. Não acredito no elixir da vida eterna, e considero que o facto de a dimensão humana como a conhecemos, finita, é melhor para a humanidade. A consciência de que somos mortais ajuda a valorizar e priorizar o que realmente é importante para sermos felizes enquanto cá estamos. Há muitos medicamentos revolucionários, mas as pessoas não se devem esquecer do quanto é importante ter um estilo de vida saudável. Os medicamentos não devem ser a única escolha.
- Qual a sua dose diária de inspiração para enfrentar desafios?
Ouvir uma boa música ajuda a pensar de forma positiva e a ter consciência que sou uma pessoa realizada e feliz. Olhar cada dia como uma nova oportunidade de fazer melhor, resolver o problema do dia anterior, e relativizar os problemas.
- Se pudesse trabalhar ao lado de qualquer cientista/personalidade da História, quem seria e o que desenvolveriam juntos?
Madame Curie, por ser mulher, por ter sido a primeira a lhe ser reconhecido o contributo para a ciência e humanidade, com o Prémio Nobel, primeiro da Física e depois da Química. A identificação dos elementos químicos rádio e polónio foi determinante na descoberta da radioatividade e do seu uso primordial no diagnóstico de fraturas e da radioterapia no tratamento do cancro.
O que descobriríamos juntas: uma radioterapia que não tivesse efeitos secundários. A própria Curie morreu aos 66 anos, crê-se vítima de leucemia na sequência dos anos de trabalho e experiências no laboratório sem qualquer proteção. Na saúde não há solução terapêutica ou meio de diagnóstico que não seja isento de efeitos secundários. Seria extraordinário dispormos de soluções de diagnóstico ou terapêuticas, tão específicas quanto possível, que não afetassem negativamente os tecidos envolvidos ou seja, sem efeitos secundários.
- Qual é o maior placebo na área da farmácia que todos precisam parar de acreditar?
Por definição os placebos são substâncias inertes e, por isso, sem atividade farmacológica. O ser humano é muito complexo e nem tudo se consegue explicar por mecanismos farmacológicos bem definidos e conhecidos. Mas o meu conselho vai para deixarem de acreditar cegamente e ter muito cuidado no uso de produtos chamado naturais e suplementos alimentares, frequentemente com um marketing fortíssimo, apesar da escassa ou duvidosa evidência científica do seu valor terapêutico. Alguns desses produtos podem ter efeitos secundários sérios e, por outro lado, podem mascarar sinais e sintomas, contribuindo para o atraso no diagnóstico de doenças graves.
- O que mais a cura nos dias difíceis?
Pensar nas coisas boas. Nos meus filhos, na minha família, nos colegas e nos amigos. Todos são suportes essenciais para a nossa saúde mental. A nossa felicidade não deve assentar apenas em um ou dois pilares. Somos muito mais equilibrados se a nossa vida assentar em várias vertentes: na nossa realização profissional, pessoal, familiar e social. Ajuda muito a rever as prioridades na nossa vida e a relativizar os problemas, muitas vezes menores, do dia a dia.
- Qual a ‘interação medicamentosa’ perfeita entre farmacêuticos e outras áreas da saúde?
No âmbito da indústria farmacêutica, na área da saúde destacaria a atividade clínica e o seu papel no desenvolvimento de novos medicamentos, desde as fases de desenvolvimento farmacêutico de novas fórmulas, até à informação e formação dos prescritores e dos farmacêuticos na interface com a sociedade. É uma interação muito positiva e benéfica para o desenvolvimento de novas soluções terapêuticas, partilhando objetivos comuns, com o foco na saúde e no paciente.
- Se pudesse prescrever uma receita para a profissão farmacêutica, o que incluiria?
Uma receita que tivesse as seguintes substâncias ativas: muita ciência, competência e profissionalismo para criar uma base sólida de conhecimento técnico. Nunca esquecer a Ética e Integridade para garantir práticas responsáveis e confiáveis; adicionar uma dose generosa de Gestão e Liderança para orientar e inspirar as equipas e administrar com empatia e comunicação para fortalecer as relações profissionais! Finalizava com Resiliência e Capacidade de adaptação para enfrentar os desafios e mudança, neste mundo muito competitivo e global.
O resultado será uma profissão ainda mais valorizada e respeitada pelo seu sentido de missão e de serviço, pela saúde e bem-estar de todos.
- Qual é o maior desafio de ‘manipular’ os problemas da profissão?
A palavra manipular nos dias de hoje tem uma conotação negativa, muito distante da palavra “manipular” da arte farmacêutica magistral, processo de carácter técnico, de mistura e homogeneização de substâncias ativas e excipientes em pequena escala e segundo a arte, para garantir a qualidade do preparado.
Transportando para a profissão farmacêutica, prefiro substitui a palavra “manipular” por gerir. A melhor maneira de ultrapassar as dificuldades profissionais que vamos enfrentado, passa por sabermos gerir as nossas expectativas perante as oportunidades de um mercado livre e competitivo. Não tenho uma visão pessimista da profissão farmacêutica, bem pelo contrário. Reconheço as dificuldades dos colegas que trabalham sob a alçada do SNS mas que é transversal a outras profissões da área da saúde.
O exercício da profissão na Indústria farmacêutica é desafiante, mas muito promissor e por isso cada vez mais atrativa para as novas gerações de farmacêuticos.
- Qual é a ‘posologia’ para ser um bom líder no órgão a que concorre?
Será necessariamente um medicamento de associação de várias substâncias ativas nas doses terapêuticas certas e bem balanceadas. Experiência e conhecimento, iniciativa e competência, a par da Integridade e ética, liderança e perseverança! Essencialmente enquanto Líder dar o exemplo, e neste caso em particular do Conselho do Colégio da Especialidade da Indústria Farmacêutica, gostar de servir a profissão que abracei há 35 anos.
- Se pudesse eliminar uma única “reação adversa” da profissão, qual seria?
Eliminaria o egocentrismo, porque destrói todos os outros fatores positivos para trabalhar em equipa e não é compatível com o desígnio do farmacêutico, que é, em última instância, servir os outros.
- Qual é a sua visão para a Indústria Farmacêutica daqui a 10 anos?
Do ponto de vista de processo, muito mais automatizada e digitalizada. Do ponto de vista de soluções terapêuticas, muito mais focada na medicina personalizada e nas soluções tendo por base a terapia genética e agentes biológicos, com o propósito de curar a doença, em vez da medicina tradicional focada em tratar os sintomas. Sinceramente, espero que a tecnologia continue a evoluir, que o trabalho manual seja substituído por automatização, que a inteligência artificial nos permita tomar mais decisões, mais inteligentes, mais rápidas e acertadas. Que o farmacêutico continue a ser o profissional na vanguarda do desenvolvimento e industrialização das soluções terapêuticas e a ser o fiel da balança na tomada de decisões, na libertação de lotes, na salvaguarda da segurança e bem-estar de todos.