Sedimentos da necrópole islâmica de Santarém ajudam a estudar infeções 11 de Novembro de 2015 Os sedimentos recolhidos dos corpos exumados nas escavações na necrópole islâmica de Santarém estão a ser usados numa investigação sobre infeções parasitárias em populações antigas, primeira do género em Portugal, disse à “Lusa” o arqueólogo do município. António Matias, que integra a equipa de investigadores, disse à Lusa que os sedimentos que recolheu durante as escavações realizadas no Largo Cândido dos Reis, em Santarém, em 2004 e 2005, serviram de base para os primeiros estudos realizados em Portugal sobre paleoparasitologia, infeções parasitárias em populações antigas, neste caso entre os séculos VIII e XII. Os resultados, disse, vão ser publicados na próxima edição da revista científica “International Journal of Paleopathology”. A existência de um protocolo com a Universidade de Coimbra, que disponibiliza para investigação o material recolhido pelo gabinete de Arqueologia da Câmara de Santarém ao longo de décadas de escavações, levou a que a investigadora brasileira Luciana Sianto, sob orientação de Ana Luísa Santos, do Departamento de Ciências da Vida da UC, tivesse conhecimento da existência destes sedimentos, integrando-os num trabalho mais amplo que visa associar os resultados obtidos em Portugal aos de alguns países da América, da Ásia, da África e da Europa. Segundo uma nota da Universidade de Coimbra, os investigadores têm estado a analisar sedimentos recolhidos em esqueletos humanos adultos (homens e mulheres com idades compreendidas entre os 20 e os 70 anos), desde o século VIII até ao século XX. Os primeiros resultados conhecidos sugerem que a população portuguesa, particularmente da região de Lisboa, «tinha menos verminoses [doença produzida pelo excesso de vermes nos intestinos] que outras populações da Europa». O fenómeno tem motivos desconhecidos, mas a razão pode estar numa «alimentação diferenciada ou mais saudável», afirma a nota do Departamento de Ciências da Vida (DCV) e do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da UC. Nessa nota, é pedida a colaboração da comunidade científica nacional da área (arqueologia e antropologia) para o fornecimento de material, dada a importância de reunir o maior número de amostras possível. No caso dos sedimentos, a sua sensibilidade levou-o a recolher e armazenar o material que encontrou agarrado aos ossos sobretudo da zona pélvica mas também do crânio, onde poderiam ser encontrados ovos de parasitas, o que se veio a verificar. «Estamos a estudar que tipo de parasitas existiam», tendo sido possível identificar ovos do helminto trichuris trichiura, um parasita específico dos seres humanos, que aparece frequentemente em material arqueológico europeu (os mais antigos do período Neolítico) e que se verificou afetar o crescimento das crianças (detetado na paragem de desenvolvimento dos dentes) e casos de anemia (na análise do crânio). «Cada fêmea deste parasita pode produzir entre 3.000 e 20.000 ovos por dia, sendo considerado um importante problema de saúde pública, relacionado com precárias condições de higiene. Estima-se que, atualmente, 800 milhões de pessoas estejam infetadas em todo o mundo» afirmou. Segundo o arqueólogo, «o uso de excrementos humanos na fertilização de solos é uma importante fonte de infeção, especialmente quando os alimentos são consumidos crus», podendo causar anemia, atraso no crescimento infantil e prolapso retal. Ramo da paleopatologia, a paleoparasitologia estuda parasitas em material arqueológico e paleontológico. Nas últimas décadas, investigadores de vários países têm estudado quais os parasitas a que os grupos humanos têm sido expostos ao longo da sua evolução biológica e cultural. Em Portugal, estes estudos iniciaram-se em 2014 através do trabalho de Luciana Sianto (da Universidade FIOCRUZ, Brasil) e de Ana Luísa Santos (da Universidade de Coimbra), frisou. |