Sustentabilidade da Indústria Farmacêutica: O Acesso à Saúde e à Inovação! 314

 

 

Mário Ribeiro RN, MSc,

Professor Assistente na CESPU, Membro da The Artificial Intelligence and Health Research Unit e Membro do Knowledge Center de Health Economics and Management 

 

 

A sustentabilidade na Indústria Farmacêutica é muitas vezes entendida apenas do ponto de vista ambiental, descurando outras importantes áreas de atuação.  A sigla ESG (Environmental, Social and Governance) traduzida por ambiente, social e governança, carateriza na sua plenitude o verdadeiro alcance da sustentabilidade.

Na Indústria Farmacêutica o ‘S’ de social está intrinsecamente associado à componente de acesso, mais concretamente o acesso ao medicamento. Este domínio de sustentabilidade representa um desafio e uma oportunidade de reconhecimento internacional para os ‘big players’ desta indústria, facto que é destacado pela prestigiada organização Access to Medicines Foundation, que classifica as empresas farmacêuticas quanto ao acesso dos seus produtos no mercado. Nesta classificação, pelos critérios de inclusão presentes, nenhuma empresa portuguesa se encontra presente. No âmbito do desafio proposto durante o curso ‘Global Pharma Industry: Patient, Strategy and Innovation’, desenhámos um projeto de sustentabilidade num país em desenvolvimento, coordenado por uma empresa portuguesa que no seu core de atividade se distingue pela produção de medicamentos genéricos.

Neste contexto, o modelo EthioHTN, é um projeto recém-desenvolvido e sustentável financeiramente, que tem como objetivo o aumento do acesso a anti-hipertensores na Etiópia, o segundo país com maior população em África. A sustentabilidade financeira do projeto só é possível alcançar tendo por base uma economia de escala alicerçada a um forte e robusto projeto de cooperação e parcerias. Pretende-se expandir o acesso a anti-hipertensores acessíveis e melhorar a gestão de saúde no país.

Esta iniciativa aborda um desafio significativo de saúde, uma vez que a hipertensão arterial afeta 25% da população, contribuindo para 46% de todas as mortes num país com 123,4 milhões de pessoas. A elevada prevalência de hipertensão arterial, aliada ao crescimento económico do país e ao investimento do governo em saúde, apresenta uma oportunidade de mercado estratégica. Além disso, associam-se três objetivos fundamentais: melhorar o acesso à saúde, aumentar a consciencialização sobre a doença e colaborar com prestadores de cuidados de saúde para melhor a capacitação e eficiência do sistema de saúde na gestão das doenças cardiovasculares.

O centro de ação inicial será em Addis Abeba, onde o alvo de impacto é de 1,4 milhões de pessoas. A estratégia de entrada no mercado para EthioHTN assenta em três pilares:

O primeiro pilar, consiste na criação de um portfólio de cinco anti-hipertensores (amlodipina, bisoprolol, hidroclorotiazida, atenolol e candesartan). A garantia de acesso passa por organizar uma equipa de gestores comerciais e programas comerciais para interagir com os distribuidores, farmacêuticos e hospitais no país. O segundo pilar corresponde ao acesso à educação e saúde, com um modelo inovador de prestação de serviços, telemedicina e soluções de saúde digital, assim como programas de aumento de consciencialização em saúde na população. O terceiro pilar incide na otimização do acesso da população aos anti-hipertensivos, avaliando e monitorizando de forma regular o progresso deste projeto.

Para o sucesso do modelo EthioHTN, foi desenvolvida uma parceria estratégica com a empresa Ethio-pharma, que por ser uma das principais empresas farmacêuticas do país, permitirá a partilha de custos, o conhecimento local e a ajuda na logística de campo. Também serão realizadas parcerias com hospitais, clínicas locais de saúde e ONGs como Médicos Sem Fronteiras e Healthtech Hub Africa. Estes últimos permitem a utilização de modelos inovadores de prestação de serviços (clínicas móveis, telemedicina, cuidados de saúde ao domicílio) e programas educativos para o aumento da literacia em saúde.

Quanto à linha de tempo operacional, está planeada a implementação estratégica em três fases, introduzindo cinco medicamentos genéricos, com um modelo de preços escalonado para garantir acessibilidade. Nos primeiros três anos, espera-se impactar 12,5% da população da capital, alcançando 178,3 mil pessoas. Após cinco anos, estima-se benefícios governamentais projetados em $63,1 milhões, incluindo $52,6 milhões em economias de custos devido à redução de eventos hipertensivos e $10,5 milhões em benefícios económicos devido a uma força de trabalho ativa. Nos sete anos seguintes, espera-se expandir o acesso aos medicamentos para outras áreas urbanas e rurais, reinvestir os lucros para melhorar a escala e o impacto do programa, e após cinco e dez anos, ter 7% e 9% de lucro, respetivamente.

Em conclusão, o projeto EthioHTN usa objetivos SMART, para acompanhar o progresso em direção à obtenção de uma participação de mercado de 10% nos centros urbanos alvo e 40% em Addis Abeba dentro de dez anos, com um aumento no acesso a anti-hipertensores. Este projeto apresenta um mercado potencialmente lucrativo para produtos anti-hipertensores enquanto aborda simultaneamente uma necessidade crítica de saúde pública na Etiópia, sendo o sucesso dependente de parcerias eficazes, sensibilidade cultural, preços acessíveis e monitorização contínua.

Este projeto representa um modelo de gestão integrado, sustentável financeiramente, com impacto significativo no acesso ao medicamento compatível com as metas da indústria farmacêutica. Por isso, espera-se que sirva de exemplo e inspiração, para que outros surjam em prol de melhor acesso, menor iniquidade e melhor saúde!

Foi realizado no âmbito do curso executivo: Global Pharma Industry: Patient, Strategy and Innovation, por: Mário Ribeiro, Ana Guedes, Mariana Almeida, Susana Maria e Ana Luísa Faria com o acompanhamento e orientação de Daniel Guedelha e Nina Fernandes.