Transformar o SNS 1117

“Transformar o SNS” foi o mote da conferência organizada pela Fundação para a Saúde – SNS (FSNS) no passado dia 23 de maio, no Auditório do Museu do Oriente. Durante este evento, foi possível assistir a um dos mais nobres exercícios da sociedade contemporânea – a democracia participativa em prol de um sistema nacional de saúde mais robusto e moderno, que genuinamente esteja estruturado em torno das necessidades dos cidadãos.

Entre os oradores presentes, podemos destacar alguns nomes de renome, como os ex-Bastonários da Ordem dos Farmacêuticos, os Professores Doutores Ana Paula Martins e José Aranda da Silva, assim como o Professor Doutor Constantino Sakellarides ou a Professora Doutora Maria de Belém Roseira, mas também alguns jovens, como o Vice-Presidente da Associação Nacional de Estudantes de Medicina ou a Presidente da Federação Nacional de Associações de Estudantes de Enfermagem. Esta conferência promoveu, deste modo, uma discussão intergeracional que perspetivou, acima de tudo, apresentar soluções concretas para um SNS com tanto potencial de melhoria.

Há que ter orgulho da prestação pública de cuidados em saúde. 41 anos depois, o SNS mantém-se fiel aos seus valores basilares no que concerne à universalidade no acesso à Saúde, e os indicadores não mentem: é de se reconhecer o aumento notável da esperança média de vida em Portugal ao longo das últimas décadas. Não obstante, é reconhecida a insuficiência crónica no investimento público em Saúde ou as fragilidades ao nível de infraestrutura e recursos humanos. Mas será que a debilidade se cinge à alocação de recursos por parte da tutela? Esta foi apenas uma das diversas questões-chave que tiveram resposta durante um dia acesso de debate, indo ao encontro de um enquadramento para um sistema que, com exatamente os mesmos recursos, poderia apresentar resultados manifestamente mais positivos. 

Fragilidades ao nível da comunicação de dados ou na multidisciplinaridade das equipas, não só de profissionais de saúde, mas também de âmbito institucional, estão na raiz das fragilidades. Por outro lado, a elevada centralização de processos com consequente sobrecarga de burocratização e comprometimento da autonomia dos agentes de saúde também foi apontado como uma problemática de relevo. Na era da transição digital, não é impossível encontrar agilmente soluções dinâmicas que façam jus às necessidades de uma rede complexa de profissionais com diversos âmbitos de intervenção mas que, ao final do dia, têm exatamente o mesmo objetivo.

Por outro lado, importa refletir na visão que os portugueses têm da Saúde em Portugal. Cingir-se-á ela aos cuidados hospitalares? Ao SNS? Ou há outros agentes que desempenham um papel importante? 

Apesar de o Plano Nacional de Saúde apresentar objetivos cruciais em linha com uma estratégia mais que necessária para o bem-estar dos portugueses face aos desafios da década, aparenta ignorar a existência de uma ampla rede de farmácias que, aos dias de hoje, nunca disse não a nenhum desafio que as circunstâncias impuseram ao país. Adicionalmente, tivemos oportunidade de assistir a uma discussão no âmbito do Orçamento de Estado, em plenário da Assembleia da República, onde a comparticipação pública dos testes rápidos de antigénios ao SARS-CoV-2 nas farmácias comunitárias foi avaliada, por um deputado, como um “mau investimento no privado”. 

Importa que haja uma visão pragmática e integrada da Saúde em Portugal. Há infraestrutura, valor científico e potencial profissional para concretizar auspiciosamente os desígnios do SNS, mas que são sistematicamente desvalorizados ou ignorados face a superstições ideológicas que, caso não sejam desmistificadas, importam ser salvaguardadas com mecanismos de transparência e confiança pública que permitam realizar parcerias estratégicas para a qualidade de vida e bem-estar de todos nós. Acima de tudo, há que participar, avaliar, propor e concretizar. A Saúde é de todos nós, e iniciativas como esta renovam a esperança de que haverão sempre portugueses desprovidos de interesses secundários e empenhados em acrescentar um pouco de valor a este país que tanto estimamos: transformar Portugal, transformando o SNS.

Bruno Alves
Presidente da Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia (APEF)