Um anúncio que cheira a peixe? 1332

Um determinado anúncio de um laboratório farmacêutico tem feito algum furor e lançado algumas discussões (pelo menos, entre os profissionais da área) devido à sua “rudeza”.

O anúncio aborda o problema da vaginose bacteriana, com um headline que diz e cito: “Nem todas fomos feitas para cheirar a peixe lá em baixo”.

Não vou discutir os critérios estéticos, nem a provável desadaptação da campanha (que é internacional) à nossa cultura.

O que acho interessante é que, apesar da aparente falta de delicadeza, este anúncio pode vir a revelar um elevado nível de eficácia. Porquê?

É que para estar disposto a escolher uma marca o consumidor precisa, entre outras coisas, de ser capaz de a conhecer ou reconhecer dentro da categoria onde ela atua – aquilo a que se chama notoriedade. No essencial, o que isto quer dizer é que ninguém pode optar por algo que não conhece. Ora, o impacto que a campanha pode ter devido à tal falta de – chamemos – delicadeza, pode, na verdade, contribuir para um ganho importante de notoriedade da marca.

Ou seja, uma consumidora ao ser afetada por este problema pode lembrar-se que esta marca promete a resolução deste. Em termos de persuasão publicitária, isto quer dizer que boa parte do caminho de sedução está feito. Falta, claro, a atitude face à marca: gosta-se, odeia-se, é-nos indiferente, etc. E aqui sim pode haver problemas graves. Basta que um grupo de pessoas se mostre indignada com a abordagem feita e mova um processo de cancelamento à marca e passamos do 8 ao 80.

Conclusão: tal como na vida, também na publicidade o caminho é pouco linear e, acima de tudo, muito imprevisível.

João Barros
Professor na Escola Superior de Comunicação Social e Investigador no Centro de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa