A saúde em Portugal enfrenta um desafio crescente: como manter ou melhorar os cuidados de saúde com os recursos atuais? A ausência de estratégias e/ou políticas de saúde que tenham por base um modelo de criação de valor é um facto. A integração vertical de cuidados é uma realidade que necessita obrigatoriamente da nossa reflexão. A prestação de cuidados sem evidência da criação de valor tem de deixar de ser uma realidade.
A otimização do percurso do doente deve ser uma definição estratégica, sabendo que a sua operacionalização tem uma base geográfica curta e uma oferta de cuidados por vezes dispersa, complexa, fragmentada, ineficiente, com uma inexplicada variação, e consequente desperdício de cuidados e respetivos custos. O foco não deve ser num mecanismo cego de controlo da despesa mas sim na criação de valor em termos de resultados clínicos que interessam aos doentes e cujo resultado tem um custo certo para a maximização desses resultados e consequente criação de valor no seu ciclo total de cuidados num verdadeiro modelo focado no doente.
O conceito de implementação da estratégia VBHC leva a uma rutura do paradigma atual. Hoje, as organizações exigem agilidade, integração, inovação e cultura necessárias para lidar com novas ameaças e oportunidades num ambiente de intensa mudança. As organizações de saúde são sistemas complexos constituídos por uma variedade de serviços com diversas especialidades, características diferentes e onde os recursos humanos e técnicos variam e articulam-se entre si de uma forma dinâmica. Essa diversidade conduz a uma autonomia muito grande, mas por outro lado, dificulta uma ação conjunta e articulada dos serviços.
Desta forma, as decisões de prestação de cuidados devem ser organizadas numa abordagem multidisciplinar centradas no doente, em que a transparência é o elemento chave competitivo de resultados em saúde. O VBHC possui no seu “ADN” este conceito de tomada de decisão partilhada, incorporando esta mudança no paradigma atual de medição dos resultados principalmente pelo conceito de PROM (“patient-reported outcome measures”) que frequentemente geram comportamentos paradoxais.
Normas sociais e as intenções de comportamentos são críticas, mas é muito importante entender quais as variáveis que influenciam as mudanças de atitudes e a respetiva cultura organizacional, pois a liderança é chave.
A literatura é clara ao evidenciar o nexo de causalidade entre a dupla integração estratégica top-down através das políticas e reputação externa e uma estratégia bottom-up através de liderança, gestão, cultura, clima organizacional de segurança psicológica, estratégia, estrutura e processos.
Atualmente deparamo-nos ainda com lacunas entre a tomada de decisão partilhada entre médico e doente e o conceito de VBHC.
A capacitação para a tomada de decisão do doente é por vezes negligenciada pela falta de literacia na relação entre médico e doente; e desta forma, surgem novos desafios neste modelo como os paradoxos organizacionais, o paradoxo do controle e da flexibilidade. Novos atores com papéis específicos, como enfermeiros, como gestores de doença, mostram como a complexidade e a pluralidade conduzem a paradoxos pertencentes ou tensões de identidade.
É nesta essência que o modelo de formação e educação do conceito de VBHC requer focalização, porque é através desta metodologia que efetivamente o conceito ganha tração na sua incorporação organizacional.
Com a crescente evolução dos dados no tempo, existem mecanismos que ajudam a decisão de uma medicina baseada em evidência. Desta forma, emerge um equilíbrio dinâmico entre a mudança na integração de uma cultura de saúde baseada em valor e uma estratégia centrada no doente – Paradoxo da aprendizagem (sistemas dinâmicos que mudam, renovam e inovam). Tais tensões refletem a natureza e o ritmo da inclusão de novas ideias, incluindo tensões entre inovação radical, incremental e mudanças episódicas e contínuas.
O desenvolvimento da cultura organizacional numa estrutura de VBHC necessita de maior incorporação de conhecimento teórico-prático, para que não ocorram excessos de confiança nas suas explicações e para que não seja apenas aplicação de rótulos institucionalizados que protejam as lógicas dominantes.
Neste contexto, diagnosticar e caracterizar a cultura organizacional é fundamental para que se possa definir o caminho a seguir de acordo com os objetivos pretendidos numa estratégia de mudança organizacional. A principal questão é: Porque falham as organizações em integrar um modelo de VBHC e porque é que este modelo tem uma tração limitada na sua efetividade.
Filipe Costa
Nova School of Business and Economics
PhD Candidate in Management
Researcher NHEM